Após séculos de desenfreada perseguição, que quase o levaram à extinção no território nacional, o lobo, eterno foragido, tantas vezes considerado como «inimigo público número um», encontrou abrigo legal em 1988. Nesse ano, é votada na Assembleia da República e publicada a Lei de Protecção do Lobo Ibérico, a Lei n.90/88 de 13 de Agosto, posteriormente regulamentada na Lei 139/ 90 de 27 de Abril. Mas a legislação— que marca uma inegável viragem na atitude face ao grande e incompreendido predador— não veio resolver todos os problemas relativos à presença do lobo em Portugal. Uma história milenar de rancores e mal-entendidos não se altera do dia para a noite.
Canis lupus signatus é o nome científico da raça de lobo que desde tempos imemoriais habita a Península Ibérica. Mais pequeno do que algumas das raças da mesma espécie que se distribuem, ou distribuíam, por quase todo o Hemisfério Norte e para além dele, da América do Norte a Portugal, da Sibéria à Índia, ocupando muitos habitats diferentes, que abrangem as florestas temperadas, os matagais mediterrânicos, os pré-desertos e as selvas hindustânicas.
O lobo ibérico distingue-se pela pelagem de coloração geral acinzentada, com a zona dorsal castanho-amarelada, mesclada de negro, particularmente sobre o dorso. A zona central é clara, de tom em geral branco amarelado. A cauda é acinzentada, com ponta negra e tem ainda uma pequena mancha dorsal negra no seu terço superior.
Mede entre 131 e 178 cm (machos) e 132 a 165 cm (nas fêmeas.) e pesa, no caso dos machos, entre 20 e 36 kg (média 28 kg). Quem já viu um lobo não esquecerá facilmente os seus belos olhos oblíquos, cor de topázio, e a expressão inteligente que define este predador sociável e gregário, que se organiza em alcateias de rígida hierarquia social e caça com métodos de cooperação que lhes permitem capturar presas difíceis e corpulentas por vezes.
A escassez de presas na Natureza, consequência da acção humana, essencialmente corços e veados, mas também javalis e mamíferos e (aves) mais pequenos, como coelhos, é um dos factores mais cruciais no progressivo desaparecimento do lobo. Apertado pela fome, percorre o território em busca de alimento. Quando o alcança, é por vezes sob a forma de gado doméstico, à solta nas serras ou em cercados de pastores, onde pode causar prejuízos avultados. Começam então os problemas do lobo com o homem, seu eterno rival e perseguidor. Embora a lei actual preveja indemnizações para as rezes abatidas por lobos, a demora no seu pagamento e hábitos antigos e arreigados levam ao uso irresponsável de venenos, grande causa de morte para o lobo e para muitos outros animais bravios.
A protecção legal chegou quase no derradeiro minuto para o lobo. Mas sem ele, encarnação da natureza selvagem, as nossas serras jamais seriam as mesmas.
Séculos a fio, eram pagos prémios para quem apresentasse a pele do lobo abatido, e ainda há pouco tempo esses prémios eram pagos pelas entidades oficiais, quando não se realizavam as tristemente célebres «batidas» onde viaturas, cães e espingardas concorriam para um único fim: o extermínio do odiado animal, que certos mitos e lendas classificaram sempre como maligno, quase diabólico, materialização do mal.
A verdade é que o lobo ocupa um lugar importante nos ecossistemas onde vive, e que em alguns países da Europa e na América do Norte se procura recupera-lo, estando a ser reintroduzido em algumas áreas de onde estava ausente há séculos.
Em Portugal restam uns 200 a 300 lobos, divididos em cerca de 50 ou 60 alcateias. Este efectivo (15% da população ibérica) situa-se na maioria a norte do Douro, sendo que a sul restam poucos e a sua situação é preocupante.
Algumas alcateias mais ou menos isoladas têm vindo a ser estudadas, como as da serra da Freita e da serra D`Arga. Trata-se de áreas onde, se nada for feito, o lobo pode extinguir-se dentro de pouco tempo.
Mas a verdadeira questão é afinal, esta: queremos ou não conservar o lobo e os seus habitats, uma Natureza viva e pujante onde a presença de predador é garantia da saúde e da riqueza do ambiente? Ou deixaremos, apesar das leis que o protegem, que este ser extraordinário venha a fazer parte da nossa (amarga) recordação?
Da parte oficial, pouco tem sido feito e espera-se a implementação do prometido «Plano de Acção para a Conservação do Lobo Ibérico». Diga-se de passagem que apenas uns 30% da área de distribuição do lobo está classificada como Área Protegida ou Rede Natura 2000.
O dilema permanece— nada está decidido à partida e depende de nós a escolha!
Bernardino Guimarães
sexta-feira, abril 17, 2009
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Excelente trabalho e como se mantém actual! Infelizmente ,o problema da relação Home / Lobo, continua por resolver.
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