quarta-feira, maio 20, 2009

ESCOLA AURÉLIA DE SOUSA: ARBORICÍDIO!

Enquanto escrevo estas linhas, ouço distintamente os sons das moto-serras trabalhando. Quis a sorte ingrata que, a poucos metros de onde moro, se desenrole uma drama de lesa-ambiente. Na Escola Secundária de Aurélia de Sousa, no Porto, foram destruídas todas— ou quase todas, que a devastação ainda decorre a estas horas— as árvores que bordejavam o grande pátio e os muros desse estabelecimento escolar.
O cronista pretendeu ter explicações. Um telefonema para o Conselho Executivo da Escola foi infrutífero: que nada podiam fazer, que as obras de «beneficiação» são da responsabilidade da Parque Escolar EPE, uma empresa criada pelo Governo.
Moradores da zona, indignados, dão-me conta do que para eles significavam aquelas árvores, presentes ali, segundo eles, há talvez uns 50 anos. Como se fosse necessário dizerem-me; eu que todas as manhãs ouvia o melro entoando as suas canções flauteadas. O calor do Verão encontrava ali uma barreira que tornava mais amena a canícula. Nas noites quentes, um leve perfume invadia as casas. Os miúdos da Escola abrigavam-se do sol à sombra daquelas árvores.
Trata-se de uma atitude verdadeiramente criminosa. Que projecto de obras, que melhorias na Escola, decerto necessárias, podem justificar uma tal insensibilidade e desprezo pelo ambiente, pelos utentes da escola, certamente, mas também pelos moradores da área envolvente? Como é possível que, depois de tanta educação ambiental, prodigalizada nas escolas em primeiro lugar, não se tenha em conta a necessidade de preservar o coberto vegetal, compatibilizando esse cuidado com as obras que seja preciso fazer?
Ocorre-me que, limpas as ramagens e os troncos do que foram árvores frondosas e belas, arrumado o terreno e concluídas as construções que ocasionaram o arboricídio, a Escola há-de prosseguir com a sua missão de ensinar a defesa do ambiente conforme os curricula vigentes. Os professores transmitirão noções de ecologia e alertarão os jovens alunos para os perigos e horrores dos problemas ambientais globais. A desflorestação da Amazónia não há-de faltar como tema palpitante. E chegado o mês de Março, na Escola Aurélia de Sousa alguma chamada de atenção haverá para o Dia Mundial da Árvore e da Floresta. Será sumamente ridículo o que devia ser útil e generoso. A destruição destas árvores, a mineralização brutal do espaço onde decorre a vida escolar de centenas de alunos é uma lição bem mais viva do que todo um compêndio de ecologia!
A verdade é que o que se passa nos estabelecimentos de ensino, nomeadamente escolas secundárias, respeita exclusivamente ao Governo e a uma série de buro-tecnocratas sem rosto, decidindo na sombra de estruturas demasiado opacas. Não deveria a autarquia local ter uma palavra a dizer quando se trata— e é o caso— da alteração súbita do ambiente urbano de uma zona da cidade, que deixa de contar com mais um «pulmão», do dia para a noite, sem explicações nem aviso, e sem escrutínio público de qualquer espécie?
O melro não cantará mais, perto do muro da escola. O betão invadirá o espaço livre. A qualidade do ar e o conforto térmico do tecido urbano em volta, irá piorar sem remédio. Crime sem castigo. Desatino justificado com o «pugresso» dominante.
Bela lição de respeito pela Natureza! Resta esperar que os alunos da Escola, dentro de alguns anos, possam ter a consciência e inteligência que faltou aos que hoje, são responsáveis pela gestão do espaço onde se preparam para a vida, num mundo cada vez mais pobre e feio.
Nisto, pára aqui a crónica. Mais uma árvore tombou aqui ao lado. Será a última?
Bernardino Guimarães
(Os desgostos do Peregrino, em Fevereiro deste ano. Uma «modernização» muito ao gosto desta época. Já deu inaugurações, visitas ministeriais,
propaganda. O Peregrino sente a falta das árvores…)

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