quarta-feira, março 17, 2010

HÁ CIDADES COR DE PÉROLA

Há cidades cor de pérola onde as mulheres


existem velozmente. Onde

às vezes param, e são morosas

por dentro. Há cidades absolutas,

trabalhadas interiormente pelo pensamento

das mulheres.

Lugares límpidos e depois nocturnos,

vistos ao alto como um fogo antigo,

ou como um fogo juvenil.

Vistos fixamente abaixados nas águas

celestes.

Há lugares de um esplendor virgem,

com mulheres puras cujas mãos

estremecem. Mulheres que imaginam

num supremo silêncio, elevando-se

sobre as pancadas da minha arte interior.



Há cidades esquecidas pelas semanas fora.

Emoções onde vivo sem orelhas

nem dedos. Onde consumo

uma amizade bárbara. Um amor

levitante. Zona

que se refere aos meus dons desconhecidos.

Há fervorosas e leves cidades sob os arcos

pensadores. Para que algumas mulheres

sejam cândidas. Para que alguém

bata em mim no alto da noite e me diga

o terror de semanas desaparecidas.

Eu durmo no ar dessas cidades femininas

cujos espinhos e sangues me inspiram

o fundo da vida.

Nelas queimo o mês que me pertence.

o minha loucura, escada

sobre escada.



MuIheres que eu amo com um des-

espero .fulminante, a quem beijo os pés

supostos entre pensamento e movimento.

Cujo nome belo e sufocante digo com terror,

com alegria. Em que toco levemente

Imente a boca brutal.

Há mulheres que colocam cidades doces

e formidáveis no espaço, dentro

de ténues pérolas.

Que racham a luz de alto a baixo

e criam uma insondável ilusão.



Dentro de minha idade, desde

a treva, de crime em crime - espero

a felicidade de loucas delicadas

mulheres.

Uma cidade voltada para dentro

do génio, aberta como uma boca

em cima do som.

Com estrelas secas.

Parada.



Subo as mulheres aos degraus.

Seus pedregulhos perante Deus.

É a vida futura tocando o sangue

de um amargo delírio.

Olho de cima a beleza genial

de sua cabeça

ardente: - E as altas cidades desenvolvem-se

no meu pensamento quente.


                                              Herberto Helder

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