sexta-feira, abril 16, 2010

POEMA BARROCO

Os cavalos da aurora derrubando pianos

Avançam furiosamente pelas portas da noite.

Dormem na penumbra antigos santos com os pés feridos,

Dormem relógios e cristais de outro tempo, esqueletos de atrizes.

O poeta calça nuvens ornadas de cabeças gregas

E ajoelha-se ante a imagem de Nossa Senhora das Vitórias

Enquanto os primeiros ruídos de carrocinhas de leiteiros

Atravessam o céu de açucenas e bronze.

Preciso conhecer meu sistema de artérias

E saber até que ponto me sinto limitado

Pelos sonhos a galope, pelas últimas notícias de massacres,

Pelo caminhar das constelações, pela coreografia dos pássaros,

Pelo labirinto da esperança, pela respiração das plantas,

E pelo vagido da criança recém-parida na Maternidade.

Preciso conhecer os porões de minha miséria,

Tocar fogo nas ervas que crescem pelo corpo acima,

Ameaçando tapar meus olhos, meus ouvidos,

E amordaçar a indefesa e nua castidade.

É então que viro a bela imagem azul-vermelha:

Apresentando-me o outro lado coberto de punhais,

Nossa Senhora das Derrotas, coroada de goivos,

Aponta seu coração e também pede auxílio.


                                 Murilo Mendes

1 comentário:

  1. "Preciso conhecer meu sistema de artérias

    E saber até que ponto me sinto limitado"

    Todos nós , temos as nossas limitações,segue a
    coreografia dos pássaros e vencerás.

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