terça-feira, junho 08, 2010

POEMA DE SETE FACES

Quando nasci, um anjo torto

desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.


As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.


O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.


O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.


Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.


Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.


Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo

                                         Carlos Drummond de Andrade

1 comentário:

  1. Drummond é formidável, sabes que este poema faz-me lembrar da música de outro gênio, a letra da música é está:

    Até o Fim

    Quando nasci veio um anjo safado
    O chato do querubim
    E decretou que eu estava predestinado
    A ser errado assim
    Já de saída a minha estrada entortou
    Mas vou até o fim
    "inda" garoto deixei de ir à escola
    Cassaram meu boletim
    Não sou ladrão , eu não sou bom de bola
    Nem posso ouvir clarim
    Um bom futuro é o que jamais me esperou
    Mas vou até o fim
    Eu bem que tenho ensaiado um progresso
    Virei cantor de festim
    Mamãe contou que eu faço um bruto sucesso
    Em quixeramobim
    Não sei como o maracatu começou
    Mas vou até o fim
    Por conta de umas questões paralelas
    Quebraram meu bandolim
    Não querem mais ouvir as minhas mazelas
    E a minha voz chinfrim
    Criei barriga, a minha mula empacou
    Mas vou até o fim
    Não tem cigarro acabou minha renda
    Deu praga no meu capim
    Minha mulher fugiu com o dono da venda
    O que será de mim ?
    Eu já nem lembro "pronde" mesmo que eu vou
    Mas vou até o fim
    Como já disse era um anjo safado
    O chato dum querubim
    Que decretou que eu estava predestinado
    A ser todo ruim
    Já de saída a minha estrada entortou
    Mas vou até o fim

    Chico Buarque
    Composição: Chico Buarque

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