sábado, julho 31, 2010

CLIMAS


Deixou quase de se ouvir falar de clima. Ou melhor: de clima a propósito da alteração do mesmo, ou melhor ainda, de aquecimento global, vulgo efeito de estufa. De clima porque está quente—e como tem estado quente!—ou porque não está, de clima bom para a praia ou para a montanha, disso fala-se concerteza. De resto, é bem sabido que conversa sobre clima é mesmo uma muleta universal, salvadora nas ocasiões em nada há para dizer que ocorra e faça sentido. Socializar com um « está um tempo fresco para a época» ou ainda « está um destes calores!» continua a ser aceitável em muitas circunstâncias.
O clima, já se sabe—muda. Mutável é por natureza e lógica, e nem sempre sabemos porquê ou em que sentido. Também a percepção do clima, do tempo que faz como se diz, varia e muda com os ventos e os tempos. O pino do Estio, com a canícula a abater-se sobre as esplanadas, é ocasião propícia, à reflexão sobre aquecimento global? Nesse caso os rigores do Inverno tenderão a esbater essa tendência, tornando sazonal a consciência de que há um problema com o clima.
Mas após a cimeira mundial de Copenhaga, nem sazonalmente se verifica a preocupação sobre as alterações climáticas. Passou de moda, foi-se o tempo em que as previsões de Al Gore deixaram petrificada a opinião pública global.
Muita água correu debaixo das pontes desde esse alerta. Após uma bem sucedida operação mediática e política, descredibilizou-se a ciência que nos compelia a mudar de vida, se não queremos que o clima mude a ponto de tornar árido e incerto o ambiente que nos suporta a vida neste planeta azul.
Que não, que se aquecimento há, não se deve à poluição de origem humana-- e o dióxido de carbono, de vilão deste filme, quase passou a herói.
Não parece muito difícil adivinhar quem tinha e tem motivos para travar a preocupação com o clima e com as causa da sua instabilidade; os mesmos que agora se condoem com o petróleo por eles derramado nas costas orientais americanas, mas que pretendem continuar a vender-nos petróleo e a refiná-lo e a extrai-lo, de modo a que a nossa dependência,, da humanidade inteira, se perpetue e com ela os lucros estratosféricos.
Copenhaga falhou. Esfumou-se, como Co2 saindo da chaminé de uma central térmica ou do escape de um automóvel, a esperança de um acordo que realmente enfrente o problema, reduzindo as emissões dos gases que os cientistas, Climagate à parte, insistem em indicar como culpados, da subida constante dos termómetros no mundo todo.
Meses depois, já foi possível ilibar os investigadores acusados de manipulação de dados para favorecimento da causa. Tudo não passou, diz quem sabe, do aproveitamento de falhas humanas, demasiado humanas, que não chegam para desmentir que existe o problema das mudanças climáticas, e que a causa desse problema é o excesso de gases de efeito de estufa lançados para a atmosfera no decurso das actividades humanas.
Por isso o clima deveria deixar de ser parte de um discurso vazio, próprio de quem nada tem para dizer. Se os políticos e os potentados económicos esqueceram, ou fingem esquecer este tema, favorecidos na sua suspeita amnésia pela eclosão da crise económica mundial, a verdade persiste.
Com a melhor ciência como base, devemos manter-nos atentos, sabendo todos o que deve mudar nas nossas atitudes para que os sistemas fundamentais que regulam a Terra e a mantêm habitável, não colapsem de forma mais ou menos rápida. Por isso o clima, que dá sinais de crise um pouco por toda o globo, não sairá facilmente da agenda. Os próximos episódios deste drama serão decisivos.
Bernardino Guimarães
( Crónica para Antena 1, em 28/7/010)

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