segunda-feira, julho 05, 2010

DESOBEDIÊNCIA CIVIL

«Sob um governo que prende qualquer homem injustamente, o único lugar digno para um homem justo é também a prisão. Hoje em dia, o lugar próprio, o único lugar que Massachusetts reserva para os seus habitantes mais livres e menos desalentados são as suas prisões, nas quais serão confinados e tranca­dos longe do Estado, por um ato do próprio Estado pois os que vão para a prisão já antes tinham se confinado nos seus princípios. E aí que devem ser encontrados quando forem procurados pelos escravos fugidos, pelo prisioneiro mexicano em liberdade condicional e pelos indígenas, para ouvir as denúncias sobre as humilhações impostas aos seus povos; é aí, nesse chão discriminado, mas tão mais livre e honroso, onde o Estado planta os que não estão com ele mas sim contra ele - a única casa num Estado-senzala na qual um homem livre pode perseverar com honra. Se há alguém que pense ser a prisão um lugar de onde não mais se pode influir, no qual a sua voz deixa de atormentar os ouvidos do Estado, no qual não conseguiria ser tão hostil a ele, esse alguém ignora o quanto a verdade é mais forte que o erro e também não sabe como a injustiça pode ser combatida com muito mais eloqüência e efetividade por aqueles que já sofreram na carne um pouco dela. Manifeste integralmente o seu voto e exerça toda a sua influência; não se deixe confinar por um pedaço de papel. Uma minoria é indefesa quando se conforma à maioria; não chega nem a ser uma minoria numa situação dessas; mas ela é irresistível quando intervém com todo o seu peso. Se a alternativa ficar entre manter todos os homens justos na prisão ou desistir da guerra e da escravidão, o Estado não hesitará na escolha. Se no ano corrente mil homens não pagas­sem os seus impostos, isso não seria uma iniciativa tão violenta e sanguinária quanto o próprio pagamento, pois neste caso o Estado fica capacitado para come­ter violências e para derramar o sangue dos inocentes. Esta é, na verdade, a definição de uma revolução pacífica, se é que é possível uma coisa dessas. Se, como já ouvi um deles me perguntar, o coletor de impostos ou outro funcionário público qualquer indagar: "Mas o que devo fazer agora?", a minha resposta é: "Se de fato quiser fazer alguma coisa, então renuncie ao seu cargo". Quando o súdito negou a lealdade e o funcionário renunciou ao seu cargo, então a revolução completou-se. Mas vamos supor que há violência. Não poderíamos considerar que uma agres­são à consciência também provoca um tipo de ferimento grave? Um ferimento desses provoca a perda da autêntica humanidade e da imortalidade de um homem, e ele sangra até uma morte eterna. Posso ver esse sangue a correr, agora.»

                                   Henry David Thoreau, extracto de « A Desobediência civil.»

2 comentários:

  1. Bernardino,
    Interessante a publicação, muito!
    Penso que os homens, uns viciados no poder, outros, na submissão, se acomodam. Mas a submissão, vimos recentemente o caso da Tunísia e Egito e agora de outros paíse árabes, a submissão se rebela um dia. O que resiste é a volúpia dos poderosos. Mas esses, caem também. Acho que daqui a um ano, o mundo não será o mesmo! Vamos caminhando para isso, peregrino inquietante!
    Regina Gaiotto

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  2. Belo texto.
    "Manifeste integralmente o seu voto e exerça toda a sua influência; não se deixe confinar por um pedaço de papel. "
    Não podemos , de facto, ser submissos e acomodados.

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