terça-feira, janeiro 18, 2011

JARDIM DA PRELADA

1)Os jardins, os parques, as árvores, não têm vida fácil nas cidades. Não nestas cidades onde a dinâmica do betão predomina e oprime, e enquanto não mudarem os hábitos e rotinas que relegam para última das prioridades a sustentabilidade, o ambiente urbano e a qualidade de vida dos cidadãos. Algum dia, convirá fazer o estudo do que é o «discurso ambiental» propalado por autarcas e agentes económicos, fazendo a análise comparativa rigorosa com os actos, as medidas reais a respeito do ambiente. Será fácil demonstrar a enorme distância que vai das palavras aos actos.
O que se passou com o jardim da Prelada, ou melhor, com o jardim que existia, contíguo aos prédios da Urbanização Nova da Prelada, na rua Professor Carlos Lima, parece ser demonstrativo de uma grande falta de atenção ao papel das zonas verdes, isto para dizer o menos.
O terreno era municipal, mas foi sendo tratado pelos moradores da referida urbanização, que lhe dedicaram tempo, dinheiro e carinho— e umas boas dezenas de árvores ali vegetavam já desde há 17 anos, cuidadas por quem pensou que aquele terreno, sendo público, estaria ao abrigo das fúrias betonizadoras: ledo engano! A Câmara do Porto resolveu vender a parcela— sem disso avisar os moradores— e eis que vasto parque de estacionamento, que servirá de apoio a um supermercado, se prepara para ocupar o local.
O abate das árvores veio súbito, como é costume, qual operação de comandos, para evitar obstáculos em pleno acto arboricida, e criando facto consumado!
Pode dizer-se que se trata de um caso exemplar (dentro do género mau exemplo) porque a autarquia muda o estatuto e função do terreno em causa, transaccionando-o sem acautelar nada de essencial.
As autarquias não são agentes imobiliários— e cabe-lhe velar pelo interesse público. A transparência deve nortear os seus actos.
Com este caso, fica indelével a mancha numa política urbanística que tem alardeado— por vezes com verdade e acerto— o primórdio do interesse colectivo sobre os grupos de interesses, e uma atenção às «chagas urbanísticas» que na cidade proliferam— pesada herança recebida. Em que ficamos? Pelo que se viu na Prelada, é de recear o pior…e outros sinais há pela cidade que acentuam o desconforto causado pelo fosso entre o que se promete…e o que se faz.
O solo crescentemente impermeabilizado, com todas as consequências que tal acarreta, a eliminação das funções ecológicas vitais do solo vivo e da vegetação, na absorção de poluentes atmosféricos e na retenção da água, na preservação da biodiversidade, tudo isso não parece estar na lista de prioridades de quem «faz cidade».

2) Os dados recentes, fornecidos pela Rede Eléctrica Nacional (REN) vieram trazer a lume a contradição das políticas energéticas do país: há uma boa notícia, que confirma o crescente peso da produção de electricidade a partir de fontes renováveis: 52,3% em 2010, contando com o ano chuvoso que potenciou a energia hidroeléctrica. Refira-se, para além do crescimento da eólica, a inclusão como «energia verde» da que é produzida nas barragens, uma classificação pelo menos polémica. Mas enfim, no geral, facto positivo.
Má notícia que se lê nos mesmos dados da REN: Portugal consome cada vez mais energia, apesar da crise. Aumento de consumo em 3,3%--mais do dobro do crescimento da riqueza nacional expressa em PIB. O desperdício e a falta de eficiência no uso da energia continuam a ser o principal problema, apesar de haver um Plano oficial para o assunto.
De que vale produzir mais energia, renovável que seja, se é perdida e gasta sem proveito para ninguém e com prejuízo para a economia e ambiente? Um tema pertinente, sem dúvida!
Bernardino Guimarães
( Crónica publicada no Jornal de Notícias em 18/1/2011)

2 comentários:

  1. As tuas crónicas são fonte de séria reflexão. Espero que cheguem a quem de direito e surtam efeitos práticos.
    Parabéns pelo teu trabalho.

    ResponderEliminar
  2. Quando o poder económico prevalece.....

    Parabéns pelo excelente trabalho e pela persistência em prol de uma causa tão nobre.

    ResponderEliminar