segunda-feira, junho 06, 2011

ELEIÇÕES SEM AMBIENTE

Alguns leitores terão reparado que, durante a campanha eleitoral, pouco ou nada se falou em Ambiente ou em qualquer dos temas que se prendem com a «crise ambiental» ou ecológica que, no entanto, não deixaram de existir nem diminuíram de importância ou gravidade. Que os partidos políticos de maior expressão— com raras e ocasionais excepções— tenham ignorado a dimensão ecológica dos nossos problemas, já é motivo de espanto. Mas se pensarmos que esses mesmos partidos formatam o seu discurso e decisões ao que pensam ser as preocupações dos seus eleitores potenciais, e às suas preferências e «agenda», então é difícil não concluir que a sociedade portuguesa vê com relativa indiferença esse alheamento político. E isso sim, dá-nos que pensar. Se o ambiente abonasse muitos votos, com certeza os partidos políticos e os técnicos de comunicação que os aconselham encontrariam resposta para um «segmento» eleitoral apetitoso.
Mas se é como se viu, então que tem sido feita de tanta «sensibilização» ambiental, e como se entende a difusão, cada vez mais ampla, da consciência alertada para o esgotamento de recursos, para a destruição da paisagem, da biodiversidade, para a contaminação dos rios e do mar, para o desordenamento do território, para as mudanças do clima induzidas pela poluição que expedimos para a atmosfera? Tudo terá ficado submerso nas ondas da crise económica e nas receitas para a vencer. Chegado o país à curva apertada da História onde se atolou, com trauma de perda progressiva de soberania e autonomia de decisões graças ao peso insuportável da dívida, os cidadãos centraram-se nas preocupações imediatas e urgentes— tantas vezes preocupações de sobrevivência.
Só que um pouco de debate e de aprofundamento, indo à raiz dos problemas (é esse o bom sentido da palavra «radical») ---não deixaria de pôr a nu as misérias do modelo de desenvolvimento que escolhemos e promovemos durante largos anos. Talvez devesse ser o tema central de qualquer discussão sobre as causas e as saídas possíveis para a crise. Esse modelo assentou no betão, (não é lugar comum!) entre obras públicas mais ou menos faraónicas e um incentivo brutal (e doentio) à construção e imobiliário, impulsionado pelos juros baixos, pela apelo generalizado à aquisição de casa própria, com a morte anunciada do mercado de arrendamento e o abandono dos centros tradicionais das cidades. Alguém dizia que boa parte da crise financeira nacional se deveu a uma «bolha imobiliária», mais discreta mas não menos séria do que a espanhola.
O abandono da terra, a ausência de políticas para o mundo rural e suas actividades, a ruína da floresta, a expansão desenfreada dos subúrbios citadinos, são outras facetas desse modelo «torto».
Pensou-se que «desenvolver» seria tudo atravessar por auto-estradas, que progredir seria incentivar o consumo que endivida e fragiliza o futuro.
Não permite a crónica mais considerações sobre matérias que dariam pano para mangas. Mas fica a urgência de reflexão sobre que país queremos, que projecto nacional desejamos, a que Europa ambicionamos pertencer.
O modelo de desenvolvimento envolve ambiente e sociedade, envolve economia e ecologia, cultura e natureza. A menos que nos conformemos com as receitas tecnocráticas da «troika» e pensemos ver nessas medidas mais do que um aflitivamente necessário «acerto de contas» com resultados aliás bastante duvidosos.
Pouco disto esteve presente nas eleições, com evidente empobrecimento do debate político. Mesmo tendo ontem sido dia de escolhas políticas e também Dia Mundial do Ambiente. Ironia subtil do calendário!
Bernardino Guimarães

1 comentário:

  1. Ironia subtil do calendário!
    Sim,ainda hoje referi este problema na minha aula do 12ºano de Biologia.

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