segunda-feira, abril 13, 2009

VERDE ESCONDIDO

Uma cidade pode ser «lida» de várias formas. E mesmo quando pensamos conhecê-la, tê-la na memória e nos passos, sabê-la de cor e salteado, há sempre alguma coisa que escapa. A nossa geografia acusa lacunas, existem perspectivas que não suspeitamos, desmentindo a ilusão de familiaridade que o tempo parecia autorizar.
O Porto, que sabemos carente de árvores e espaços vegetalizados, talvez nos surpreenda se tomarmos em linha de conta os jardins, os quintais, os logradouros arborizados escondidos no interior dos quarteirões da cidade antiga. O que foram pomares e hortas que serviam casas, no esconso entre ruas, espaços fatiados por muros de pedra, albergando memórias burguesas ou paredes-meias com vetustos bairros operários-- tudo isso faz parte de uma Invicta que o tempo…já venceu. Pelo menos em boa parte, esses cantinhos ficaram esquecidos, ao ritmo do êxodo para fora da cidade, do despovoamento da cidade tradicional. Mas está lá o essencial, se quisermos ver os quintais pelo ângulo da sua função ecológica: presença de arvoredo, solo permeável, captação de carbono e produção de oxigénio. São esses logradouros que podem suprir em parte, no casco antigo da cidade, a falta absoluta de zonas verdes. Vistas do céu, (há fotografias que o demonstram) permitem que nos apercebamos da sua dimensão considerável.
O problema é que longe da vista…longe do coração. No processo de reabilitação do edificado, na Baixa e não apenas, é preciso que os logradouros dos quarteirões sejam tidos em conta e valorizados, como realidade urbana que são, e— espera-se— não encarados como espaço vago, onde se pode resolver, por exemplo, o problema do estacionamento. Seria um crime de lesa-ambiente, contradizendo o princípio essencial da mesma reabilitação.
Não é raro termos notícia de edifícios que são renovados, com sacrifício do quintal das traseiras, cimentado, ocupado por garagens ou simplesmente para aumento da edificação. Trata-se, além do mais, de uma violação das normas camarárias estabelecidas, quando não do próprio PDM. Mas quem repara? O ficar por detrás das fachadas e oculto a quem passa na rua, pode ser motivo para mais um pequeno «ecocídio». Até que nada reste.
Mais atenção a este problema e uma estratégia clara para a defesa dos modestos, mas decisivos, espaços verdes «interiores», a sua integração nos projectos de reabilitação de quarteirões, será pedir muito? Alguns destes espaços, constituídos por conjuntos de antigos quintais ou jardins, se devidamente tratados e pensados, podem ser uma mais-valia na cidade, que precisa de vegetalização em vez de mineralização…antes que seja tarde demais!
Bernardino Guimarães

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