segunda-feira, maio 04, 2009

O CHOQUE DO BETÃO

Como se esperava, vem aí (mais) betão. A resposta ao atraso estrutural do país, às dificuldades no emprego e às assimetrias regionais, deu nisto: obras públicas, enormes investimentos, infra-estruturas. O Estado assume o comando da dinamização da economia. Uma lista pletórica se anuncia— ele são auto-estradas, pontes, TGV, barragens, aeroporto. Para trás fica o conhecimento, a qualificação das pessoas e a valorização do território, a sustentabilidade e outras muletas discursivas hoje suplantadas. Para amortecer, mesmo temporariamente o desemprego, para aproveitar a ligeira folga orçamental e o novo quadro de apoio europeu, para ganhar eleições e fazer esquecer tristezas, eis que se escolheu…o cimento.
Muitos irão saudar, neste eterno retorno a uma das constantes da política portuguesa, a «modernização» do país, na vaga de fontismo anacrónico. Mas outros, desmancha-prazeres, notarão o carácter efémero dessa festa e o gasto de recursos em prioridades erradas.
Soube-se que a área de Lisboa é já a região europeia com maior densidade de auto-estradas, e que o país inteiro se prepara para encabeçar a lista das nações com mais dessas vias rápidas…que no entanto não detiveram, antes pelo contrário, o despovoamento do interior, e o êxodo imparável para as imensas aglomerações urbanas do litoral.
As regiões europeias mais ricas, no entanto, nem de longe esquadrinharam desta forma o seu território com auto-estradas, e os «exemplos económicos» que gostamos de evocar (Irlanda, Finlândia, Suécia) apostaram antes na educação, ciência e formação das pessoas e resolveram os problemas de transporte com ferrovia convencional, a mesma que Portugal despreza e condenou a uma quase irrelevância. Mas nada disto impressiona os nossos decisores.
Parece, que mesmo o facto de toda a anunciada parafernália infra-estruturante configurar, contas feitas, um aumento decisivo das emissões poluentes (que o país está obrigado a conter, sob pena de graves problemas futuros) não merece, dos governantes, mais do que um bocejo.
Entretanto, a paisagem é vandalizada, as reservas naturais encolhem, a biodiversidade sofre. Os grandes empreiteiros rejubilam, e com a classe política realizam as transferências da época, deslocando pessoal, do parlamento e governo para os conselhos de administração (e vice-versa?) como se fosse preciso demonstrar quem é que manda e onde está o verdadeiro poder.
Condenada a possibilidade de um modelo de desenvolvimento menos espectacular (e menos rentável eleitoralmente, no curto prazo que é o prazo que conta) mas mais produtivo, e afastada a sustentabilidade como objectivo, fica a consolação da aposta nas energias renováveis, que deve ser considerada positiva, (ainda assim «manchada» pela insensibilidade ambiental e duvidosa utilidade do plano nacional de barragens).
Resta marchar, ao som dos tambores da modernidade, para um futuro em que seremos campeões das auto-estradas sem deixarmos de encabeçar a estatística das desigualdades sociais, da iliteracia e da desqualificação profissional. Um futuro próximo em que Ambiente, paisagem e ordenamento do território, sacrificados no altar de uma certa ideia de progresso, se tornaram valores secundários, inconciliáveis com o crescimento necessário da construção civil— pelos vistos, o derradeiro sector competitivo e capaz de induzir vitalidade a uma economia anémica.
Mas deve ficar claro: este não é o único caminho. Podia ser diferente, fazer-se diferente.
A grande mentira consiste em apregoar a inevitabilidade do que não é senão uma opção. Errada. E cuja factura pagaremos todos!

Bernardino Guimarães

1 comentário:

  1. hoje estou com a veia revolucionaria. Nao me apetece escolher as palavras. pois claro, porque nao!? Viva o betao. Tem de positivo, o trabalho, a reparaçao das estradas, a venda de carros, combustiveis, pneus (bom para minha amiga Diana), enfim positivo para todos. Um carro para 4 pessoas faz algum sentido? E os impostos que se deixam de cobrar? Nem pensar! Viva o betao, Sr do Blog

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