Sempre o voo migrador das aves impressionou os homens de todos os tempos. Pensar que pássaros pequenos efectuam migrações que cruzam continentes, voando muitas vezes durante a noite, vencendo mil perigos e orientados por sistemas de navegação que em boa parte ainda nem compreendemos, já que o fenómeno das migrações das aves é ainda um «dossier» em aberto para a Ciência, apesar de tudo o que se foi aprendendo ao longo dos anos.
Orientação pelas estrelas ou pela posição do sol, ou pelo magnetismo da Terra que minúsculas glândulas no seu corpo permitem detectar e seguir, ou ainda a conjugação maravilhosa destes factores, o mistério persiste.
Na Antiguidade chegou a pensar-se que as aves hibernavam, já que desapareciam em determinada época do ano; houve quem pusesse a hipótese de emigrarem, sim, mas para a Lua. Hoje sabemos que uma andorinha que risca o céu sobre os telhados do Porto, no Verão, passará a estação seguinte nas savanas africanas, onde os insectos nunca faltam. Uma garça, um pintassilgo-verde ou uma ave de rapina que voam sobre um campo português nos rigores do Inverno, na Primavera criarão nas costas da Escandinávia.
A anilhagem sistemática permite desvendar o rumo dessas viagens, roteiros milenares. As aves fizeram a globalização antes de todos os outros seres, e navegaram pelos ares ligando continentes quando os homens, se existiam, nem sequer sonhavam com a realidade de um mapa-múndi.
Acresce que Portugal é um grande aeroporto internacional para as aves, conectando as rotas migratórias europeias e africanas. Muitos locais, como as zonas húmidas, sapais, estuários, lagoas costeiras, ou as planícies alentejanas, ou as montanhas do interior, fazem parte do sistema ecológico onde se movimentam as aves viajantes, uma maravilha da Natureza que devemos prezar e preservar. Não sei se já deram pelos estorninhos que proliferam por vezes nas árvores do Porto, no Inverno, ou pelos tordos que ainda visitam os campos em volta da Invicta. Esses bandos, já exaustos, vêm do norte da Europa e pousam nas nossas paragens, buscando alimento e abrigo.
Qualquer um de nós pode ajudar estas criaturas fantásticas e aprender a observá-las.
Eu olho para o pisco-de-peito ruivo imóvel no muro do jardim, e para a alvéola bicando insectos no relvado. Mentalmente saúdo as pequenas/grandes aventureiras. E agradeço-lhes. Enquanto existirem, quem poderá aborrecer-se?
Bernardino Guimarães
(Crónica para a Antena 1 em 28/1/010)
Foto de Raízes.e.Asas
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