Quem passeia pela marginal do Douro, do lado do Porto, pode deparar-se com belos cenários, convidativos e relaxantes. Não apenas a paisagem urbana, mas «amostras» de biodiversidade ao alcance da vista: junto ao local onde desagua a maltratada ribeira da Granja, num pequeno sapal entre rochas, um apontamento de arte diz-nos que estamos num «Observatório de Aves». Na realidade, aí se concentra um elevado número de aves, de gaivotas de várias espécies a corvos-marinhos, de garças-reais a patos, sem esquecer os pássaros mais pequenos. Ali assim, mesmo com ribeira e rio desgraçadamente ainda poluídos, as aves selvagens encontraram local de abrigo e alimentação, certamente porque ali também não faltam diversos peixes e invertebrados de fazem as suas delícias.
Mudando de margem, o estuário do Douro e o seu Cabedelo oferecem um espectáculo ainda mais atraente e diversificado. Dezenas de espécies, onde pontifica o colorido guarda-rios e a beleza delicada das andorinha-do-mar, as garças e todo um conjunto de migradoras que, seguindo rotas que acompanham as linhas de costas desde o norte da Europa, pousam ali para descanso. Se as deixarmos, claro, que nem sempre o comportamento dos cidadãos ajuda à estadia destas hóspedes aladas. Felizmente, o estatuto de reserva natural que foi conferido a esta área em breve se deve fazer sentir no terreno.
Noutros locais preservados, como no vasto parque de Serralves, no Jardim Botânico ou na zona onde virá a ser o Parque Oriental, e mais adiante pelas margens dos rios até à serra de Santa Justa e para lá dela, alberga-se o que nos ficou, resistente, de herança natural. Para os que amam as aves e são atraídos pelo seu estudo e observação fora dos livros especializados, também a reserva do Mindelo— hoje Reserva do Litoral de Vila do Conde— é sítio a descobrir, sobrevivente a muitas e continuadas asneiras e atentados de betão.
Partindo para sul, a Barrinha de Esmoriz nunca deixou de constituir um lugar decisivo para a biodiversidade da Área Metropolitana do Porto. Vale a pena conhecê-la (e valeria a pena protegê-la e cuidá-la, coisa que os responsáveis locais têm claramente descurado).
O périplo podia ter muitas outras paragens, mas convém não abusar dos pés caminheiros do naturalista que decida desvendar estas sendas— nem da paciência dos leitores.
Para remate final: uma incursão pela natureza urbana e suburbana merece ter como meta final o Parque Biológico de Gaia, um extraordinário misto de reserva natural e centro educativo, realmente singular, (aliás pioneiro) e imperdível.
O passeio pela natureza, o gosto pela caminhada, a observação das plantas e das aves, constam entre as actividades que cada vez mais seduzem adeptos e conquistam corações e tempo livre.
Mas ainda não tanto como se vê em outras paragens da Europa. Talvez por isso, os autarcas e outros decisores que em nosso nome administram o território, prefiram ainda os trilhos fáceis daquilo a que chamam «progresso» e é tão-somente imitação e banalidade. Uma rotunda inaugurada de novo, com a sua fonte ao centro, ou uma estrada que leva a lado nenhum, quando não uma grande superfície comercial feérica e servida de grande parque de estacionamento— essas coisas fazem sonhar os eleitos locais e os ministros. Um sapal, um bosque, um rio despoluído correndo livre de barragens e de tubos, não, isso não parece que comova muito a classe política.
Questão de opção, de cultura? Mais importante é saber se seremos nós, cidadãos, a dar devida importância aos valores naturais, à biodiversidade, à integridade e beleza da paisagem e à harmonia do ambiente rural e urbano.
Bernardino Guimarães
(Crónica publicada no Jornal de Notícias em 19/1/2010)
quarta-feira, janeiro 20, 2010
NATUREZA AO PÉ DA PORTA
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