quinta-feira, abril 21, 2011

FOGOS FLORESTAIS, O DESASTRE ANUNCIADO

Páscoa chuvosa, passaram os breves dias de Abril quente e seco, que chegaram a configurar uma «onda de calor» no interior do país.
Talvez tenha passado ao lado, no meio de tanta desgraça noticiada do país entristecido e desalentado como nunca— mas o certo é que nestes dias mais quentes de estio antecipado, arderam centenas ou milhares de hectares de «mato e floresta». Tanto tempo antes do Verão, trata-se de um sinal preocupante, a lembrar-nos que a batalha dos incêndios rurais e florestais se ganha ou perde durante todo o ano e não apenas naquelas horas trágicas e épicas do «combate às chamas».
Foi entretanto anunciado que, no quadro da «contenção orçamental» que é a cura de emagrecimento forçado do Estado, haverá este ano muito menos dinheiro para o dispositivo de combate ao fogo florestal. Desastre anunciado? Pior ainda é se não se fez o «trabalho de casa» prévio, quer dizer a prevenção, e esse trabalho primordial sabemos que vem sendo descurado, a saber a gestão e ordenamento das matas, a responsabilização dos proprietários que devem caminhar no sentido da organização e do associativismo, o estabelecimento de áreas abertas que funcionem como corta-fogos, o desbaste da matos na proximidade de povoamentos e habitações isoladas, enfim, aquele mínimo que poderia unir na acção autarquias, proprietários e utentes das matas, indústrias ligadas à exploração florestal, e naturalmente as autoridades oficiais que mexem nesta importante área.
Receia-se é que, uma vez mais, pouco tenha sido realizado e que tudo esteja de novo à mercê do acaso e do crime.
O distrito do Porto, tão povoado e urbanizado, tem ainda assim cerca de 40% do solo ocupado por matas e bosques de diversos tipos, o que deve considerar-se notável. Claro que estamos a falar de matas monoespecíficas— compostas por uma só espécie ou bouças mistas de eucaliptos e alguns pinheiros bravos, o que está longe de sequer poder ser considerado floresta e deveria gradualmente ser reconvertido de modo a compor formações mais harmoniosas e ricas, já que a exploração da celulose para as indústrias de papel atravessa uma crise acentuada e a procura de madeiras nobres, como as do carvalho, embora de crescimento lento, afigura-se bem mais interessante— para não falar do aspecto ecológico e de promoção da biodiversidade. As funções da floresta são múltiplas e as matas devem ser pensadas em função da sua riqueza biológica e da protecção dos solos e da água, na limpeza da atmosfera, recursos sem os quais não vivemos e que muito devem à floresta.
Do ponto de vista económico e ecológico— e ambas as coisas se confundem se pensarmos com largueza e abrangência— vale a pena apostar na floresta. E isso implica criar, no terreno— não tanto nos gabinetes onde repousa, perene e burocracia e a inércia da administração e o alheamento dos governos— as condições para a sua protecção e crescimento.
Impressiona pensar no cenário que temos vivido nos últimos anos: nos meses de mais calor, em certos dias mais propícios à acção dos incendiários— um anel de fogo cercando a cidade do Porto, o forte cheiro a queimado invadindo ruas e avenidas do velho burgo, as cercanias da Invicta ardendo sem parar. Algumas fotografias obtidas por satélite são muito impressivas.
Isso não pode ser evitado, enquanto ainda existe alguma coisa para queimar na área metropolitana?
Pode, assim haja vontade e determinação. Mas não nos lembremos da santa apenas quando troveja, nem do ordenamento correcto e racional do território só quando já tudo são cinzas e nada.
E promova-se a reflorestação pensada e ordenada, nos terrenos que foram galgados pelo fogo. É lamentável constatar que tudo arde e a seguir…não se passa nada. Que novas plantações de floresta temos visto nesta região e no país? De que serve a luta abnegada contra o fogo, se não prevenimos a sua ocorrência nem ao menos procuramos reparar o mal feito?
Bernardino Guimarães
(Crónica para a Antena 1, em 21/4/2011)

2 comentários:

  1. Existem sempre justificações, para nada, mas mesmo nada ser feito no pós fogo...com todas as consequências ecológicas e económicas, daí resultantes. Começo a pensar, cada vez mais, que é uma questão cultural enraízada do deixa andar, que só com uma forte educação ambiental nas escolas é que se lá vai. O resto é conversa de "político"..que mal vem o Inverno, tudo esqueçe. Infelizmente. E, Portugal com tanto para aproveitar....

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  2. Aqui no Brasil,a situação não é diferente.Temos um imenso território verde,mas ele é cada vez menor.As queimadas na Amazonia só fazem avançar,sem que o governo possa ou queira impedir.O pessoal do PV(partido verde)está lutando sozinho,por mais ações de combate aos crimes ambientais.A derrubada ilegal das árvores é um deles.Ninguém faz coisa alguma.Em minha cidade,Rio de Janeiro,muitas áreas verdes estão dando lugar aos grandes prédios,e não se tem uma cultura de preservação.As pessoas derrubam árvores a toda hora,como se fosse a coisa mais normal.O povo não é educado para a preservação.E eu me pergunto:Quanto ainda o planeta terá de sangrar,antes que entendamos que é o nosso sangue,e a nossa vida que se esvai,pelo ralo da insensatez e do descaso?

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