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segunda-feira, janeiro 18, 2010

MILHÕES DE ANIMAIS SELVAGENS MORTOS ANUALMENTE NAS ESTRADAS PORTUGUESAS

18.01.2010 Lusa
Cerca de 4500 animais selvagens vertebrados morreram num ano em 37 quilómetros de estradas entre Montemor e Évora, segundo um investigador da Universidade de Évora, que admite que a nível nacional o número atinja vários milhões.
À Lusa, António Mira, da Unidade de Biologia e Conservação da Universidade de Évora, explicou que o projecto MOVE estuda os impactes das estradas, como os efeitos de barreira e repulsa e as consequências da mortalidade nos vertebrados terrestres, como anfíbios (sapos e salamandras), répteis, aves e mamíferos.
Em 2005, em 365 dias de recolha, os investigadores detectaram 4499 animais mortos num percurso de 37 quilómetros, metade dos quais corresponde a vias secundárias, com um movimento inferior a 3500 veículos por dia.“Se neste contexto morrem 4500 indivíduos num ano, imagine-se se quisermos extrapolar para todo o país, considerando todas as estradas. Têm de morrer vários milhões de indivíduos por ano e isto, na minha opinião, é significativo”, argumentou.

No entanto, o investigador lembrou que a área estudada, entretanto alargada, corresponde ao principal eixo terrestre entre Lisboa e o resto da Europa (que é atravessado pela A6, N4, com a N114 em paralelo) e num corredor que vai receber o comboio de alta velocidade”.Já foi possível concluir que os anfíbios, por exemplo, desaparecem do alcatrão porque a sua pele fina se deteriora rapidamente. Muitos cadáveres servem de “alimento fácil” para predadores, cujo risco de atropelamento aumenta.Porém, António Mira notou que aves como gralhas, pegas rabudas ou milhafres, que habitualmente se alimentam dos animais atropelados, parecem ter a capacidade de se defender, com excepção das aves juvenis. “Adoptam comportamentos que minimizam o risco de atropelamento”.

Quanto aos animais domésticos, as informações do MOVE mostram que os gatos “morrem muito”, sobretudo devido ao seu comportamento de caça a ratos e coelhos nas bermas.

Nesta altura de início do ano, devido ao cio, António Mira está convencido de que há mais mortes entre os machos dos gatos, por se movimentarem mais.Quanto aos cães, o pico de atropelamentos, “mas sem nada de exagerado” é após o início da época da caça generalizada ao coelho e perdiz. As vítimas serão os que fogem ou que “infelizmente são abandonados por não cumprirem a função”.Na totalidade do projecto, cujas contagens se foram espaçando, foram contabilizadas pelo menos 10 mil mortes, mas o investigador acredita que os valores cheguem aos 12 ou 13 mil animais.

O MOVE tem como um objectivo recolher informação para “minimizar os efeitos adversos na biodeversidade”.Em Portugal, já foram tomadas medidas, principalmente em novas-autoestradas, como a A24 e a A7, utilizando vedações de malha muito estreita e passagens seguras para animais.NO IC27 existe uma passagem inferior sobretudo dirigida a veados e javalis.Outro objectivo é avaliar, para algumas espécies, a proporção da população que morre para determinar o impacte real dos atropelamentos na população dos animais.

segunda-feira, junho 15, 2009

A CULPA É DE DESCARTES?

A celebração do Dia Mundial do Animal teve o inegável mérito de nos lembrar a importância dos seres que nos rodeiam, tão próximos e tão estranhos, e em particular aqueles que elegemos como nossos companheiros de vida e residência, ao ponto de há muito os considerarmos “domésticos”. Como reverso da medalha, o descaso, quando não a crueldade com que os tratamos, tantas vezes. Os animais despertam em nós emoções contraditórias, é certo. A nossa relação com eles, (pares da espécie humana no mesmo reino zoológico) é influenciada pelo pensamento que domina cada época e civilização, maneiras de ver a Natureza e o papel do homem nela.
Para ilustrar uma visão totalmente antropocêntrica (centrada no homem) costuma-se ir buscar René Descartes, cujos erros de avaliação têm sido muito discutidos no mundo científico de hoje. O seu pensamento, de qualquer forma, marcou profundamente um certo discurso moderno sobre a Natureza. O filósofo não tinha, que se saiba, nenhum problema pessoal com animais; antes procurava, é certo, enaltecer o Homem, tornado centro do Universo e medida de todas as coisas. Para dar forma e força a tal intenção e conceito, era preciso apoucar, rebaixar a condição animal--mais realçando o brilho e a superioridade do Homo sapiens sapiens, senhor do mundo e excepção de racionalidade na Criação.
Descartes teorizou bastante acerca dos animais, servindo-se muito da noção de autómato. O animal seria, então, uma máquina, nada mais, classificação à qual o Homem escapava por via do domínio da razão.
“ Se algumas dessas máquinas tivessem os órgão e a forma exterior de um macaco ou de qualquer animal sem razão, não teríamos nenhum meio de reconhecer que elas são de natureza diferente dos animais.” – escreveu o filósofo, para quem os animais não apenas têm menos razão do que o Homem, mas não têm mesmo absolutamente nenhuma.
Este pensamento, longe de ser bizarria peculiar de um autor, impregna indelevelmente, ainda hoje, a nossa maneira de encarar o animal, o seu direito ou a ausência dele.
Quando cidadãos “normais” abandonam, em algum sítio esconso, o animalzito que, durante meses ou anos viveu na sua casa e foi talvez “brinquedo” para os filhos; quando caçadores, no entanto tão zelosos dos seus companheiros de jornada, deixam o cão no ermo da montanha após o fim da época venatória; quando os animais destinados à alimentação humana não são, ao menos, poupados ao sofrimento tão atroz como desnecessário; quando…não, tudo isto não pode ser apenas culpa do pobre Descartes.
É certo que muita coisa mudou. Sabemos agora, que os animais, em grau e de forma diversa, expressam sentimentos e emoções e a Ciência mais actual procura mesmo escrutinar neles vestígios de “senso moral”. E sabemos – isso de certeza certa – que sentem dor e prazer, sofrem solidão e frio, adoecem e morrem como nós humanos. Isso bastará, espera-se, para justificar uma mudança de atitude por parte dos seres inteligentes que queremos ser, não só em relação aos animais domésticos, mas considerando toda a Criação, no que podem convergir as doutrinas racionalistas e a tradição espiritual, oriental ou ocidental – será preciso invocar S. Francisco de Assis?
Acima de tudo, que essa mudança se traduza em coisas concretas: nos canis municipais, nos pobres zoos que temos, no transporte de gado e de aves, nos matadouros, nos palcos e arenas onde o sofrimento é diversão para alguns. Ou no inadiável combate que é preciso dar ao escandaloso tráfico de animais, hoje com um peso financeiro mundial semelhante ao da droga e para o qual o nosso país é porta de entrada na Europa e mercado certo.
Vale a pena lembrar, como imagem impressiva, o espectáculo lamentável da portuense Feira dos Passarinhos. Este cronista lembra-se do que lá viu de degradante há uns anos: ao domingo, a Rua da Madeira enchia-se de pássaros e outros bichos exangues, entalados em gaiolas minúsculas à torreira do sol. Espécies protegidas, muitas delas. Pilhadas um pouco por todo o lado. Passou algum tempo, a Feira mudou de local. De hábitos, espero que sim.
Bernardino Guimarães
( um texto escrito em Outubro de 2004. Para arquivo do Peregrino.)