O Ambiente vai ser vítima da crise financeira? No desenrolar do novelo confuso e emaranhado, deste desmoronar de sonhos especulativos à escala planetária, ouvem-se recados e sentenças, embora poucas soluções duradouras. E algumas vozes, declaram já a necessidade de recentrarmos tudo na economia. «Agora temos que pensar no que é prioritário» bradam políticos e empresários. Nem o facto de terem sido incapazes de prever ou prevenir o que quer que fosse, embalados que estavam na bonomia do «crescimento mundial» alimentado pelas bolsas eufóricas, priva essas personagens graves de uma aura de autoridade, gurus perplexos com pouca vontade de revelar culpas e fraquezas. E o ambiente passa a «secundário»! Nessa linha, é reveladora a decisão dos ministros da economia da União Europeia, solicitando à Comissão que aligeire, ou esqueça, as quotas de emissões de gases atribuídas à indústria, primeiro passo para enterrar o plano europeu contra as alterações climáticas. Admiram-se? Contemos com mais iniciativas do género nos próximos tempos!
Trata-se de miopia, da irremediável. Como já aqui algumas vezes disse, existe uma crise económica (ou só financeira) que é conjuntural, muito embora contendo traços que denunciam qualquer coisa de mais profundo. E existe uma crise ecológica, global também e indesmentível. Estrutural.
Muitos analistas acusam o capitalismo bolsista globalizado de se ter desligado totalmente da economia real. O entusiasmo dos especuladores baseou-se durante décadas, alegremente, em produtos que verdadeiramente não existiam e em créditos sem condições reais de retorno. Os «mercados de futuros» inventavam dinheiro sobre operações e inovações que nem sequer existiam…nem estavam para existir!
A banca de investimentos mundializada esqueceu o presente e desvalorizou o trabalho e a produção efectiva de bens. Quer dizer, perdeu-se do chão que pisava.
Mas verdade (inconveniente?) é que a própria economia, há muito tempo se desconectou também da sua base real, daquilo que temos por «recursos naturais», subavaliando e gastando o «capital natural» finito— base última de toda a economia.
Desse capital natural dever-se-ia retirar, com parcimónia, parte dos «juros» que nos oferece, em água, em atmosfera, em solos, em biodiversidade, em minerais, em florestas, em sistemas que asseguram o suporte da vida. Só que a ideologia do «crescimento» assim não viu…consumindo mais do que a Terra pode dar e comprometendo equilíbrios dinâmicos sem os quais o progresso da Humanidade não é possível. Vivemos assim e de forma bem concreta …«acima das nossas posses.»
Que o agora tão condenado (mas incentivado por governantes e pensadores económicos durante anos) «capitalismo de casino», tenha dado de si e encravado numa curva sinuosa de hipotecas e empréstimos duvidosos, não pode ser motivo de pasmo. Se a própria definição técnica da «riqueza das nações» ignora os serviços dos sistemas naturais e até promove como «activos» os actos predatórios sobre esses sistemas ecológicos!
Recuar no combate às causas das alterações climáticas, no combate à perda de biodiversidade, na alteração dos rumos em energia, terá efeitos trágicos. Lembrem-se ao menos do que diz o «Relatório Stern» sobre o que pode vir a ser a crise económica real provocada pelas mudanças do clima— não são (tranquilizem-se!) conclusões de ecologistas militantes!
Mais uma vez: precisa-se de conciliação e ligação entre Economia e Ecologia.
Também para evitar as lógicas de «curto prazo», visões do lucro trimestral (de uns poucos) avassalando tudo o resto. Não foi essa, afinal de contas, a causa do buraco onde agora nos encontramos?
Bernardino Guimarães
(Crónica publicada no Jornal de Notícias)
quarta-feira, março 18, 2009
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