No ano de 1971, um pequeno grupo estabelecido no Canadá, constituído em boa parte por americanos emigrados, que recusavam a guerra do Vietname, dá forma e conteúdo ao que havia de ser a maior, mais mediática e mais polémica organização não governamental de Ambiente do mundo: a Greenpeace. Tudo começou com o protesto contra os ensaios nucleares norte-americanos. A Comissão «Não Façam uma Onda» esteve na origem de tudo. Os ensaios nucleares, efectuados no mar ou em terra, mais ou menos escondidos dos olhos da opinião pública, em clima de Guerra Fria, indignavam muitas pessoas, mas a acção concreta contra tais práticas – além do mais, verdadeiros descalabros ambientais— deixava muito a desejar. Reinava alguma passividade.
Estes ensaios, quer os realizados pelos EUA quer pela então URSS, ou ainda pela França, haveriam de marcar a agenda e a vida do Greenpeace durante muitos anos.
A 15 de Setembro de 1971, ás quatro da tarde, um pequeno barco, o Phiylis Cormack, velho arrastão da pesca do bacalhau adquirido pelos activistas, zarpou de um porto canadiano e foi o primeiro instrumento de uma «viagem contra a bomba».
Uma pequena tripulação rebaptizou o barco precário: Greenpeace era agora o seu nome. A ideia era ir ao encontro de um dos locais onde os EUA faziam explodir bombas atómicas em testes— as ilhas de Amchitka, nas Aleutas. A viagem não foi um grande sucesso, mas o enorme impacte mediático forneceu a chave de muitas novas odisseias náuticas— e o Greenpeace nascia como organização, marcado pelo mar e pelos barcos e pela sábia utilização da comunicação social para chamar a atenção para as suas causas.
O Greenpeace tem hoje uns 3 milhões de aderentes em todo o mundo, uma estrutura profissional operativa e delegações autónomas, mas coordenadas, em pelo menos 42 países. Tem sido designado por «multinacional da defesa do ambiente» e, se as suas acções espectaculares motivam simpatia e apoio, a verdade é que igualmente há quem não goste e desconfie de tanto aparato mediático. Concerteza, trata-se de uma organização única no seu género, e o seu crescimento vertiginoso criou problemas de organização e de financiamento, assim como de imagem, que aliás serviram de base a uma reforma da estrutura nos últimos anos. Entre imperfeições e vitórias assinaláveis, entre lutas que enfrentaram os poderes mais temidos da Terra e suspeitas que afectaram certos aspectos do funcionamento da Greenpeace internacional, em que pilares assenta esta ONG diferente e global?
A Greenpeace «baseia-se nos princípios filosóficos e morais da não-violência e da desobediência civil, e tem como norma operativa a acção directa.»
Na composição original da doutrina Greenpeace, mesclaram-se elementos diversos, dos movimentos pacifistas aos princípios conservacionistas, de uma certa marca «hippie» à difusa inspiração dos grupos «quakers» americanos.
Entre os fundadores destacam-se Robert (Bob) Hunter, já falecido, e Patrick Moore, que viria a abandonar a organização em 1986.
Alguns destes pioneiros, foram inspirados por uma velha lenda índia que profetizava a emergência dos «guerreiros do Arco-Íris», cuja missão seria salvar um mundo de mares enegrecidos, de rios envenenados, onde a Natureza morre às mãos da ganância humana.
A sua preocupação: a Terra. Convém não esquecer que, quando os activistas escalam o Empire State Bulding para proclamar o perigo das alterações climáticas, ou quando um outro, vestido de urso polar, é detido pela polícia em Washington, em frente ao Departamento de Defesa, chamando a atenção para o derretimento do Árctico, esses temas são falados e discutidos à escala global.
A Greenpeace também se pode gabar de ter tido parte em vitórias, que foram vitórias da Humanidade: os testes nucleares foram abolidos, a caça à baleia teve uma moratória, a Antárctida foi protegida, em acordo global, da mineração e outra ameaças, a UE proibiu a importação de peles de morsa e de outros animais em perigo, fizeram-se leis contra o despejo de detritos tóxicos e radioactivos nos mares. Sem dúvida, tal não se deveu apenas ás iniciativas dos «guerreiros do arco-íris», mas a contribuição destes não deve ser menosprezada.
A utilização do imenso poder dos media, e a compreensão desse poder, pode considerar-se uma característica da organização. Dar a imagem directa da acção, focar os problemas, seja o tráfico de madeiras tropicais e a denúncia das máfias que com isso lucram, seja— como ainda recentemente— o envio de barcos para obstruir a actividade dos baleeiros japoneses, sempre as imagens espalhadas pelas redes mundiais são vitais para a Greenpeace. Um método de trabalho, mais do que um estilo! (Quem não se lembra das imagens que mostravam as focas-bebé sendo massacradas sobre o gelo, ou o holocausto de centenas de golfinhos às mãos das frotas de pesca do atum? Ou da revelação dos despejos de resíduos tóxicos em alto mar, por conta de conhecidas multinacionais?)
David contra Golias? A vida da Greenpeace não mais foi a mesma, quando, em protesto contra os ensaios nucleares franceses no atol de Muroroa, em 1985, os ambientalistas viram o seu barco, o Raibow Warrior, na altura em águas neo-zelandesas, ser sabotado por uma bomba. Da explosão resultou a morte do fotógrafo e activista português Fernando Pereira e ferimentos em outros membros da tripulação. Meses mais tarde, foi descoberta a conspiração, concretizada pelos serviços secretos franceses, cumprindo ordens do mais alto nível do poder em Paris. Se o escândalo se saldou pela demissão do ministro da Defesa de França, e por uma crise política aguda, também a Greenpeace mudou, tirando ilações do trauma e do luto. Os poderes obscuros vendem cara a pele! Os tempos mudaram. Mas os problemas ambientais não deixaram de angustiar os povos. A crise ecológica global mostra-se na sua realidade incontornável. Tempos de mudança, sem dúvida, que não prescindem de pessoas empenhadas e capazes de sacrifício para contrariar a destruição do clima, da biodiversidade, do planeta que nos serve de casa.
Com erros e faltas, como é próprio de todas as realizações humanas! Mas, mesmo quando delas discordamos, não é difícil conceder que as acções da Greenpeace contribuem, à sua maneira, para um mundo melhor.
Bernardino Guimarães
Estes ensaios, quer os realizados pelos EUA quer pela então URSS, ou ainda pela França, haveriam de marcar a agenda e a vida do Greenpeace durante muitos anos.
A 15 de Setembro de 1971, ás quatro da tarde, um pequeno barco, o Phiylis Cormack, velho arrastão da pesca do bacalhau adquirido pelos activistas, zarpou de um porto canadiano e foi o primeiro instrumento de uma «viagem contra a bomba».
Uma pequena tripulação rebaptizou o barco precário: Greenpeace era agora o seu nome. A ideia era ir ao encontro de um dos locais onde os EUA faziam explodir bombas atómicas em testes— as ilhas de Amchitka, nas Aleutas. A viagem não foi um grande sucesso, mas o enorme impacte mediático forneceu a chave de muitas novas odisseias náuticas— e o Greenpeace nascia como organização, marcado pelo mar e pelos barcos e pela sábia utilização da comunicação social para chamar a atenção para as suas causas.
O Greenpeace tem hoje uns 3 milhões de aderentes em todo o mundo, uma estrutura profissional operativa e delegações autónomas, mas coordenadas, em pelo menos 42 países. Tem sido designado por «multinacional da defesa do ambiente» e, se as suas acções espectaculares motivam simpatia e apoio, a verdade é que igualmente há quem não goste e desconfie de tanto aparato mediático. Concerteza, trata-se de uma organização única no seu género, e o seu crescimento vertiginoso criou problemas de organização e de financiamento, assim como de imagem, que aliás serviram de base a uma reforma da estrutura nos últimos anos. Entre imperfeições e vitórias assinaláveis, entre lutas que enfrentaram os poderes mais temidos da Terra e suspeitas que afectaram certos aspectos do funcionamento da Greenpeace internacional, em que pilares assenta esta ONG diferente e global?
A Greenpeace «baseia-se nos princípios filosóficos e morais da não-violência e da desobediência civil, e tem como norma operativa a acção directa.»
Na composição original da doutrina Greenpeace, mesclaram-se elementos diversos, dos movimentos pacifistas aos princípios conservacionistas, de uma certa marca «hippie» à difusa inspiração dos grupos «quakers» americanos.
Entre os fundadores destacam-se Robert (Bob) Hunter, já falecido, e Patrick Moore, que viria a abandonar a organização em 1986.
Alguns destes pioneiros, foram inspirados por uma velha lenda índia que profetizava a emergência dos «guerreiros do Arco-Íris», cuja missão seria salvar um mundo de mares enegrecidos, de rios envenenados, onde a Natureza morre às mãos da ganância humana.
A sua preocupação: a Terra. Convém não esquecer que, quando os activistas escalam o Empire State Bulding para proclamar o perigo das alterações climáticas, ou quando um outro, vestido de urso polar, é detido pela polícia em Washington, em frente ao Departamento de Defesa, chamando a atenção para o derretimento do Árctico, esses temas são falados e discutidos à escala global.
A Greenpeace também se pode gabar de ter tido parte em vitórias, que foram vitórias da Humanidade: os testes nucleares foram abolidos, a caça à baleia teve uma moratória, a Antárctida foi protegida, em acordo global, da mineração e outra ameaças, a UE proibiu a importação de peles de morsa e de outros animais em perigo, fizeram-se leis contra o despejo de detritos tóxicos e radioactivos nos mares. Sem dúvida, tal não se deveu apenas ás iniciativas dos «guerreiros do arco-íris», mas a contribuição destes não deve ser menosprezada.
A utilização do imenso poder dos media, e a compreensão desse poder, pode considerar-se uma característica da organização. Dar a imagem directa da acção, focar os problemas, seja o tráfico de madeiras tropicais e a denúncia das máfias que com isso lucram, seja— como ainda recentemente— o envio de barcos para obstruir a actividade dos baleeiros japoneses, sempre as imagens espalhadas pelas redes mundiais são vitais para a Greenpeace. Um método de trabalho, mais do que um estilo! (Quem não se lembra das imagens que mostravam as focas-bebé sendo massacradas sobre o gelo, ou o holocausto de centenas de golfinhos às mãos das frotas de pesca do atum? Ou da revelação dos despejos de resíduos tóxicos em alto mar, por conta de conhecidas multinacionais?)
David contra Golias? A vida da Greenpeace não mais foi a mesma, quando, em protesto contra os ensaios nucleares franceses no atol de Muroroa, em 1985, os ambientalistas viram o seu barco, o Raibow Warrior, na altura em águas neo-zelandesas, ser sabotado por uma bomba. Da explosão resultou a morte do fotógrafo e activista português Fernando Pereira e ferimentos em outros membros da tripulação. Meses mais tarde, foi descoberta a conspiração, concretizada pelos serviços secretos franceses, cumprindo ordens do mais alto nível do poder em Paris. Se o escândalo se saldou pela demissão do ministro da Defesa de França, e por uma crise política aguda, também a Greenpeace mudou, tirando ilações do trauma e do luto. Os poderes obscuros vendem cara a pele! Os tempos mudaram. Mas os problemas ambientais não deixaram de angustiar os povos. A crise ecológica global mostra-se na sua realidade incontornável. Tempos de mudança, sem dúvida, que não prescindem de pessoas empenhadas e capazes de sacrifício para contrariar a destruição do clima, da biodiversidade, do planeta que nos serve de casa.
Com erros e faltas, como é próprio de todas as realizações humanas! Mas, mesmo quando delas discordamos, não é difícil conceder que as acções da Greenpeace contribuem, à sua maneira, para um mundo melhor.
Bernardino Guimarães
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