segunda-feira, junho 08, 2009

URGÊNCIA E CRIATIVIDADE

Existe uma crise ecológica, estrutural, ocultada pelos sinais de crise económica, conjuntural. Ambas se revelam no contexto global. Mas os efeitos de ambas são sensíveis na esfera local, ao pé da porta— e consequentemente parte das soluções a adoptar hão-se ser locais também. Uma resposta que não espere pela actuação nacional ou europeia, seria desejável. Que resposta?
E se a ultrapassagem da depressão económica passasse pelo enfrentar da crise ecológica, dos seus sintomas e dos seus riscos? Se, ao contrário do que nos dizem, o combate às disfunções ambientais fosse, não um entrave ao progresso real da sociedade, mas antes uma enorme, e singular, oportunidade para mudarmos e avançarmos?
É bem certo que a ideia de «desenvolvimento sustentável» (que é preciso refrescar!) se tornou em pouco mais que muleta discursiva, «sond-byte» para uso de políticos vazios e programas ocos.
Para uma grande região metropolitana como a do Porto e face ao maior problema ambiental dos nossos dias, (as alterações climáticas) há certamente a opção de ignorar, de atirar para outros a responsabilidade, até de imaginar que o degelo do Árctico não nos diz respeito e que os vendavais de Outono foram acasos sem exemplo.
Mas pode haver outra atitude, certamente: implica coragem e criatividade, e um uso útil e racional para a tão reivindicada autonomia local e regional. Poderia assim conceber-se que um pólo urbano significativo, à escala ibérica e europeia, com um milhão e meio de cidadãos, encarasse a crise das alterações climáticas com um programa abrangente e realista, multidisciplinar, visando a redução drástica das emissões de gases de efeito de estufa (GEE) — e aproveitando isso, um elenco de medidas de modificação gradual do paradigma económico.
Reduzir a poluição, que é desperdício e ineficiência antes do mais, não implica só restrições e sacrifícios. Permite economias de escala, novas formas de organizar o território, de produzir e usar a energia, modificar a vida nas cidades e potenciar de outra forma a inovação e o conhecimento.
A ideia haveria de consistir num conjunto de mudanças para promover a redução dos impactes ambientais, modernizar verdadeiramente a economia, valorizar o conhecimento e aumentar a qualidade de vida.
Nos Estados Unidos— como Bush não subscreveu o Protocolo de Quioto para redução dos GEE---são as cidades a tomarem a dianteira neste combate urgente. Muitas dessas propostas urbanas estão a servir de base à elaboração das novas estratégias da administração Obama para as alterações climáticas. Na próxima Cimeira mundial de Copenhaga, onde se debaterá o acordo que há-de vigorar de pois do de Quioto, estarão sem dúvida em cima da mesa as iniciativas locais e regionais e sua importância para reduzir as emissões de efeito de estufa.
Em Portugal, onde o governo está vinculado ao mesmo Tratado mas não o cumpre nem faz cumprir— há lugar para iniciativas do poder local.
No limite das suas competências, a Junta Metropolitana do Porto tem os instrumentos para dar início a um tal programa.
Um grande projecto de incentivo às energias renováveis, ao seu uso nos edifícios e empresas., fomentaria a inovação e a ligação aos excelentes pólos de investigação que temos; alterações na mobilidade deveriam incluir uma atenção particular à qualidade do ar, ao ruído e à humanização da vida nas cidades; incentivar a eficiência energética reforçaria a competitividade do tecido económico e o bem-estar das pessoas; criar uma verdadeira «floresta metropolitana» por exemplo a partir da recuperação da Serra de Sta Justa e imediações, iria estabelecer um «sumidoiro de carbono» e dar aos cidadãos um refúgio de lazer digno desse nome.
Enfim, urge desligar o desenvolvimento da sinistra curva de crescimento do consumo de energia e de destruição de recursos finitos—e o progresso das cidades do aumento insensato da superfície betonada e da degradação do quadro de vida.
(Esta crónica já tem dois aninhos nas costas, após a sua publicação no JN. Com ligeiras adaptações, aqui a deixa o Peregrino.)
Bernardino Guimarães
Fotos de Raízes.e.Asas

Sem comentários:

Enviar um comentário