
E se a ultrapassagem da depressão económica passasse pelo enfrentar da crise ecológica, dos seus sintomas e dos seus riscos? Se, ao contrário do que nos dizem, o combate às disfunções ambientais fosse, não um entrave ao progresso real da sociedade, mas antes uma enorme, e singular, oportunidade para mudarmos e avançarmos?
É bem certo que a ideia de «desenvolvimento sustentável» (que é preciso refrescar!) se tornou em pouco mais que muleta discursiva, «sond-byte» para uso de políticos vazios e programas ocos.
Para uma grande região metropolitana como a do Porto e face ao maior problema ambiental dos nossos dias, (as alterações climáticas) há certamente a opção de ignorar, de atirar para outros a responsabilidade, até de imaginar que o degelo do Árctico não nos diz respeito e que os vendavais de Outono foram acasos sem exemplo.
Mas pode haver outra atitude, certamente: implica coragem e criatividade, e um uso útil e racional para a tão reivindicada autonomia local e regional. Poderia assim conceber-se que um pólo urbano significativo, à escala ibérica e europeia, com um milhão e meio de cidadãos, encarasse a crise das alterações climáticas com um programa abrangente e realista, multidisciplinar, visando a redução drástica das emissões de gases de efeito de estufa (GEE) — e aproveitando isso, um elenco de medidas de modificação gradual do paradigma económico.
Reduzir a poluição, que é desperdício e ineficiência antes do mais, não implica só restrições e sacrifícios. Permite economias de escala, novas formas de organizar o território, de produzir e usar a energia, modificar a vida nas cidades e potenciar de outra forma a inovação e o conhecimento.
A ideia haveria de consistir num conjunto de mudanças para promover a redução dos impactes ambientais, modernizar verdadeiramente a economia, valorizar o conhecimento e aumentar a qualidade de vida.
Nos Estados Unidos— como Bush não subscreveu o Protocolo de Quioto para redução dos GEE---são as cidades a tomarem a dianteira neste combate urgente. Muitas dessas propostas urbanas estão a servir de base à elaboração das novas estratégias da administração Obama para as alterações climáticas. Na próxima Cimeira mundial de Copenhaga, onde se debaterá o acordo que há-de vigorar de pois do de Quioto, estarão sem dúvida em cima da mesa as iniciativas locais e regionais e sua importância para reduzir as emissões de efeito de estufa.
Em Portugal, onde o governo está vinculado ao mesmo Tratado mas não o cumpre nem faz cumprir— há lugar para iniciativas do poder local.
No limite das suas competências, a Junta Metropolitana do Porto tem os instrumentos para dar início a um tal programa.
Um grande projecto de incentivo às energias renováveis, ao seu uso nos edifícios e empresas., fomentaria a inovação e a ligação aos excelentes pólos de investigação que temos; alterações na mobilidade deveriam incluir uma atenção particular à qualidade do ar, ao ruído e à humanização da vida nas cidades; incentivar a eficiência energética reforçaria a competitividade do tecido económico e o bem-estar das pessoas; criar uma verdadeira «floresta metropolitana» por exemplo a partir da recuperação da Serra de Sta Justa e imediações, iria estabelecer um «sumidoiro de carbono» e dar aos cidadãos um refúgio de lazer digno desse nome.
Enfim, urge desligar o desenvolvimento da sinistra curva de crescimento do consumo de energia e de destruição de recursos finitos—e o progresso das cidades do aumento insensato da superfície betonada e da degradação do quadro de vida.
(Esta crónica já tem dois aninhos nas costas, após a sua publicação no JN. Com ligeiras adaptações, aqui a deixa o Peregrino.)
Bernardino Guimarães
Fotos de Raízes.e.Asas

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