quinta-feira, junho 24, 2010

ESCÂNDALO

O caso veio a lume e revela a fragilidade das políticas ambientais que temos, se as temos: há vários anos, entre o último trimestre de 2001 e o primeiro trimestre de 2002, terão sido ilegalmente depositados em S. Pedro da Cova cerca de 300 mil toneladas de resíduos industriais perigosos provenientes da fábrica da Maia da Siderurgia Nacional, em valas sem qualquer tratamento do solo.
Espera-se que as autoridades judiciais possam ir até ao fim de investigações aturadas, que o episódio merece. E que o ministério do ambiente actue em conformidade.
Tudo indica que se trata de resíduos perigosos, solo contaminado, apesar da CCRDN afirmar agora o contrário, porque segundo este organismo «todos os documentos de caracterização dos resíduos em causa, provenientes de entidades independentes e subscritos por técnicos especialmente habilitados, concluem peremptoriamente pela sua não perigosidade».
Só que, de acordo com um documento divulgado há dias, em 2004 a mesma CCDR-N remeteu informação segundo a qual se observavam «valores de crómio e chumbo nas águas subterrâneas, o que justificou ordem de selagem do depósito e a sua impermeabilização».
É legítimo suspeitar de uma provável negociata que permitiu deslocar e de algum modo esconder solos contaminados e lesivos do ambiente e saúde humana, em S.Pedro da Cova—quando deveriam ter sido depositados em aterro especial, devidamente certificado e ser tratados de modo a não ameaçarem o ambiente.
Um dos perigos é a contaminação gradual e constante das águas subterrâneas e a partir daí dos rios e ribeiros. Não se sabe que aquíferos e fontes de abastecimento de água podem ter sido afectados—e também nesse aspecto espera-se que se investigue e se tomem as medidas apropriadas.
Quanto à limpeza e remoção da área onde foram depositados os solos, a Assembleia Municipal de Gondomar reclamou do governo que «tome medidas urgentes para a resolução do passivo ambiental do Alto do Gódeo, freguesia de S. Pedro da Cova, que tem de passar, necessariamente, pela remoção dos resíduos industriais perigosos ali depositados indevidamente.» Os deputados municipais apelam ainda «para que os solos sejam descontaminados, que seja reposta «a cota inicial dos terrenos com terras limpas» e que «a Assembleia Municipal recomende à Câmara Municipal uma postura activa na resolução deste grave problema, diligenciando junto do Governo a rápida concretização das medidas referidas».
Este caso é de bradar aos céus, e de facto configura um escândalo de conivências e de silêncios, como desgraçadamente acontece nos meandros da nossa administração quando se trata de suspeitos conluios, interesses inconfessáveis e negócios estranhos. Coisa que é só suspeita, mas que deve ser clarificada sem tibiezas.
A vigilância é o preço da liberdade—escreveu alguém. E é também o preço da nossa saúde e da defesa do ambiente, tarefa que cabe a todos, reclamando mais transparência, mais responsabilidade, mais prestação de contas por parte de quem exerce funções de poder—que deveriam ser serviço e não exercício do mando sem escrutínio democrático a sério!
Bernardino Guimarães
( Crónica para Antena 1, em 24/6/10)

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