Pode perguntar-se sobre a utilidade de leis avançadas, quando de facto são muitas vezes ignoradas no quotidiano; mas ninguém nega a importância, como marco histórico, da promulgação da Lei n 11/ 87 de 7 de Abril, a Lei de Bases do Ambiente. Este diploma permitiu que o Estado, a administração pública no seu todo, pudesse incorporar os princípios básicos do ambiente e da sua protecção—e vigora até hoje como a referência fundamental.
Um pouco de contexto histórico: em 1987 a adesão de Portugal à então CEE era ainda recente, havia a necessidade, obrigatória mesmo, de enquadrar progressivamente o adquirido das políticas ambientais comunitárias, o que exigia uma Lei deste tipo.
Cerca de uma década antes, a nova Constituição da República Portuguesa afirmava pela primeira vez a importância do ambiente e do direito a um ambiente equilibrado e saudável. Os esforços para definir uma política pública de Ambiente em Portugal vinham já, é certo, da fase final do anterior regime, com a criação da comissão Nacional do Ambiente e a participação do país na Conferência de Ambiente das Nações Unidas (Estocolmo, 1972).
Pode no entanto dizer-se que foi a integração europeia o motor dessas políticas públicas de ambiente, devido à urgência de integração e transposição para o direito nacional das directivas comunitárias inseridas nos primeiros Planos de Acção da CEE em matéria de ambiente. A Lei de Bases define conceitos básicos, estabelece e enquadra princípios e valores, fixa objectivos e lista de forma geral os valores ambientais que a lei deve proteger: na Lei, são componentes do ambiente: o ar, a luz, a água, o solo vivo e subsolo, a flora e a fauna. Incorpora ainda o que são as normas para a intervenção preventiva e repressiva da administração pública, institui os direitos e deveres dos cidadãos em matérias de Ambiente e remete para posterior legislação e regulamentação as diferentes matérias dispostas na Lei.
Apesar de já na altura serem referidas por alguns debilidades jurídicas no texto da Lei de Bases, esta nunca foi revista e serve ainda de esteio às políticas ambientais.
Curioso é constatar que o tempo se foi encarregando de tornar a Lei 11 de 87 algo «datada»: nela não se faz referência a termos/conceitos como biodiversidade e sustentabilidade, hoje tão presentes, pois a sua difusão e integração no léxico é posterior. Independentemente da necessidade da sua revisão, é a falta de concretização dos seus princípios e normas, 22 anos depois, que impressiona. Navegando à vista, ao sabor de correntes contrárias, com altos e baixos mas demonstrando sempre tendência a ficar secundarizada por outros interesses e propósitos, a política de ambiente em Portugal, se inegavelmente avançou, está ainda hoje numa fase que se diria latente, muito presente no discurso político mas pouco no terreno quotidiano— e não se vê a necessária integração horizontal de políticas. O Ambiente não deve ser um sector da administração confrontado com outros; deveria ser o cerne de medidas harmoniosas entre si para uma sociedade mais equilibrada e sustentável, com mais qualidade de vida, a pensar no presente e no futuro.
Mas essa carência, que parece ainda mais grave nos últimos tempos, com recuos e inoperâncias que julgávamos impossíveis, por vezes em nome da «crise», não é culpa da «velhinha» Lei de Bases que vigora desde a já distante Primavera de 1987!
Bernardino Guimarães
Fotos de Raízes.e.Asas
Bela descrição ,numa linguagem excelente.
ResponderEliminar...E como se mantém actual!