O estado dos nossos rios é mau. Ao contrário do que seria razoável supor, não tem sequer havido melhorias importantes nos últimos anos, pelo menos compatíveis com os investimentos realizados no tratamento de esgotos e outros trabalhos.
Os problemas que afectam os rios portugueses são vários. Enumeremos alguns:
--poluição— origem esgotos domésticos e industriais, escorrências da agricultura (fosfatos etc) e de fenómenos como a erosão de solos e fogos florestais;
--Barragens e represamentos, extracção de areias
--Problemas de gestão conjunta dos rios internacionais, com Espanha, tornando difícil assegurar os «caudais ecológicos» mínimos apesar dos acordos havidos
--Má gestão dos recursos hídricos superficiais, nomeadamente na agricultura e turismo
--Perda de biodiversidade
--Indefinição administrativa— demasiados organismos públicos têm competências na gestão dos rios, confusão e sobreposição de funções
--Efeitos das alterações climáticas—- secas mais prolongadas, chuva mais escassa ou concentrada em determinada época do ano. Estes problemas relacionam-se entre si. A nova legislação comunitária impôs regras definidas para a gestão das águas. No que aos rios diz respeito, os princípios plasmados na directiva da Água foram – tardiamente— transpostas para a nova Lei da Água, ainda recente mas introduzindo regras de gestão unificadas, dividindo o país em 5 Regiões hidrográficas supervisionadas no plano nacional pelo INAG.
A gestão integrada por bacia hidrográfica já constava da legislação nacional, mas nunca foi cabalmente implementada. Resta saber se agora os princípios de gestão integrada e unificada o serão. Por exemplo, as Administrações Portuárias têm poderes consideráveis de tutela sobre os estuários dos rios e zonas adjacentes, que conflituam com as autarquias, o Ministério do Ambiente e outras entidades. Sem que haja clarificação de competências e sem que se saiba quem gere, envolvendo todos os interessados nos rios, dificilmente se resolverá o problema.
Documentos importantes: Plano Nacional da Água, Planos de Bacia Hidrológica, Lei da água, Directiva-Quadro da Água.
O estado dos rios em termos de carga poluente continua a ser preocupante.
De acordo com o Sistema Nacional de Informação dos Recursos Hídricos do INAG, mais de 44% dos recursos hídricos superficiais monitorizados tinha (2005) qualidade «má» ou «muito má» e cerca da 36% era apenas razoável. Para o INAG, nesse relatório, «esta situação põe em causa a utilização dos recursos hídricos, principalmente em caso de seca, e decorre das graves deficiências de tratamento das águas residuais.»
Deficiências que são reais— bastando consultar os relatórios da Inspecção-Geral do Ambiente sobre o funcionamento das ETARs nacionais— e mesmo estranha se atentarmos no facto de que foram gastas imensas quantidades de dinheiro, proveniente em boa parte dos fundos europeus— na construção das mesmas ETARs e em redes de saneamento.
Indústrias como os curtumes e a suinicultura, entre outras, contribuem fortemente para a contaminação dos rios e resistem a quaisquer medidas para melhorar a situação!
Um estudo da Comissão Europeia em 2004 dava conta de que Portugal não tratava adequadamente cerca de 60% das suas águas residuais! Ainda mais bizarro é que, em vez de se constatar uma evolução positiva, mesmo que lenta, pelo contrário se observam retrocessos: Em 2005 os rios com água considerada boa representavam menos 19% do que no ano anterior, e os de água «muito má» que eram 10, 8 em 2003 passaram a ser 23, 5 em 2005.
Os rios com água julgada «excelente» eram 1% do total em 2004… e um ano depois sumiram-se nos 0% confirmados!
Isto é-- não há rios com qualidade excelente no nosso país!
A água dos rios diz respeito a muitos sectores de actividade— a energia, a agricultura, o turismo, o abastecimento domiciliário, a indústria, os desportos náuticos, a conservação da Natureza. Atender a todas as solicitações não será fácil. As cabeceiras e nascentes dos rios são zonas extremamente sensíveis. Fogos florestais ou contaminações diversas podem pôr em causa o abastecimento de áreas urbanas importantes. A engenharia pesada que constrói barragens e canais de rega, que efectua regularizações de leitos de rios, ignora muitas vezes os mais elementares princípios ecológicos e prejudica seriamente as outras valências que um rio serve.
Outro problema é o preço da água. A nova legislação impõe o princípio do utilizador/ pagador, que deve ser implementado tendo em vista a boa utilização do recurso vital. Mas é urgente rever o «preço político» que sustenta com dinheiro dos contribuintes e elevado gasto de capital natural actividades que de outra forma seriam insustentáveis e onde reina o desperdício. O turismo e a agricultura devem gradualmente conformar-se a modelos de adaptação às disponibilidades hídricas disponíveis e previsíveis para o futuro, e não «violentar» com o apoio do Estado a lógica natural, com grandes barragens e transvazes a destruir a integridade dos rios apenas para proteger actividades insustentáveis. Turismo de acordo com a paisagem e o clima, reciclagem de águas residuais, aproveitamento das águas da chuva, sistemas de rega eficientes, culturas agrícolas adequadas ao clima e recursos existentes, combate às perdas no abastecimento, são medidas que ajudarão os nossos rios a tornarem-se aquilo que nunca deveriam ter deixado de ser: rios vivos. Os efeitos previsíveis nos diversos cenários de alterações climáticas devem ser tidos em conta no planeamento da gestão dos rios portugueses.
Os acordos com Espanha garantem os caudais ecológicos em tempo de seca e de seca extrema? Este problema ainda não reuniu consenso. Mas importa garantir:
--A gestão integrada e internacional dos rios (4) internacionais que temos;
--Recusar as obras faraónicas, como o desvio das águas do Norte para Sul como pretendia (pretende?) fazer o Estado Espanhol, em favor de uma abordagem sustentável da exploração do recurso água.
--Ter em atenção os factores de ameaça à integridade dos rios e evitá-las conjuntamente;
--Garantir uma gestão adequada, racional e solidária em tempos de seca prolongada, matéria extremamente sensível para Portugal;
OS PEIXES
Como não podia deixar de ser, a biodiversidade dos rios foi profundamente afectada pelos erros e omissões que permitimos, empobrecendo os rios e pondo em causa um recurso importante.
A poluição, «regularizações» de rios— lembremos o verdadeiro crime que foram as obras ao longo do Mondego—a introdução de espécies exóticas—problema extremamente grave entre nós—a poluição, extracção de inertes, etc, além da pesca desregulada, levaram a uma situação grave em termos de biodiversidade dos rios.
O recente «Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal» dá conta da situação «muito preocupante» dos peixes dos rios portugueses.
Das 35 espécies consideradas, 63% classificam-se numa das 3 categorias de ameaça. 1 espécie foi considerada extinta. Apenas 23% ficam na categoria de «pouco preocupante».
A situação pior afecta as espécies migradoras diádromas, e por outro lado algumas espécies que são endemismos ibéricos, por vezes confinadas a uma única bacia hidrográfica.
Extinta:
Esturjão (Acipenser sturio)
Criticamente Em Perigo:
Lampreia-de-rio (Lampetra fluviatilis)
Lampreia-de-riacho ( Lampetra planeri)
Saramugo (Anaecypris hispanica)
Boga do Sudoeste (Chondrostoma almacai)
Boga-portuguesa( Chondrostoma lusitanicum)
Escalo do Arade( Squalis aradensis)
Escalo do Mira( Squalis torgalensis)
Salmão-do-Atlântico ( Salmo salar)
Truta-marisca (Salmo trutta)
EM PERIGO:
Caboz-de-água-doce ( Salaria Fluviatilis)
Esgana-gata ( Gasterosteus gymnurus)
Verdemã-do-norte ( Cobitis calderoni)
Escalo -do -sul (Squalis pyrenaicus)
Boga-de-boca-arqueada ( Chandrostoma lemmingii)
Panjorca( Chondrostoma arcasii)
Barbo-do-sul (Barbus sclateri)
Cumba (Barbus comiza)
Sável (Alosa alosa)
Enguia-europeia( Anguilla anguilla)
VULNERÁVEL:
Savelha ( Alosa fallax)
Boga-do-Guadiana( Chondrostoma willkommii)
Bordalo ( Squalis alburnoides)
Lampreia-marinha (Petromyzom marinus)
Ainda outras espécies distribuem-se pelas categorias de «quase ameaçadas» e «informação insuficiente».
Bernardino Guimarães
Os problemas que afectam os rios portugueses são vários. Enumeremos alguns:
--poluição— origem esgotos domésticos e industriais, escorrências da agricultura (fosfatos etc) e de fenómenos como a erosão de solos e fogos florestais;
--Barragens e represamentos, extracção de areias
--Problemas de gestão conjunta dos rios internacionais, com Espanha, tornando difícil assegurar os «caudais ecológicos» mínimos apesar dos acordos havidos
--Má gestão dos recursos hídricos superficiais, nomeadamente na agricultura e turismo
--Perda de biodiversidade
--Indefinição administrativa— demasiados organismos públicos têm competências na gestão dos rios, confusão e sobreposição de funções
--Efeitos das alterações climáticas—- secas mais prolongadas, chuva mais escassa ou concentrada em determinada época do ano. Estes problemas relacionam-se entre si. A nova legislação comunitária impôs regras definidas para a gestão das águas. No que aos rios diz respeito, os princípios plasmados na directiva da Água foram – tardiamente— transpostas para a nova Lei da Água, ainda recente mas introduzindo regras de gestão unificadas, dividindo o país em 5 Regiões hidrográficas supervisionadas no plano nacional pelo INAG.
A gestão integrada por bacia hidrográfica já constava da legislação nacional, mas nunca foi cabalmente implementada. Resta saber se agora os princípios de gestão integrada e unificada o serão. Por exemplo, as Administrações Portuárias têm poderes consideráveis de tutela sobre os estuários dos rios e zonas adjacentes, que conflituam com as autarquias, o Ministério do Ambiente e outras entidades. Sem que haja clarificação de competências e sem que se saiba quem gere, envolvendo todos os interessados nos rios, dificilmente se resolverá o problema.
Documentos importantes: Plano Nacional da Água, Planos de Bacia Hidrológica, Lei da água, Directiva-Quadro da Água.
O estado dos rios em termos de carga poluente continua a ser preocupante.
De acordo com o Sistema Nacional de Informação dos Recursos Hídricos do INAG, mais de 44% dos recursos hídricos superficiais monitorizados tinha (2005) qualidade «má» ou «muito má» e cerca da 36% era apenas razoável. Para o INAG, nesse relatório, «esta situação põe em causa a utilização dos recursos hídricos, principalmente em caso de seca, e decorre das graves deficiências de tratamento das águas residuais.»
Deficiências que são reais— bastando consultar os relatórios da Inspecção-Geral do Ambiente sobre o funcionamento das ETARs nacionais— e mesmo estranha se atentarmos no facto de que foram gastas imensas quantidades de dinheiro, proveniente em boa parte dos fundos europeus— na construção das mesmas ETARs e em redes de saneamento.
Indústrias como os curtumes e a suinicultura, entre outras, contribuem fortemente para a contaminação dos rios e resistem a quaisquer medidas para melhorar a situação!
Um estudo da Comissão Europeia em 2004 dava conta de que Portugal não tratava adequadamente cerca de 60% das suas águas residuais! Ainda mais bizarro é que, em vez de se constatar uma evolução positiva, mesmo que lenta, pelo contrário se observam retrocessos: Em 2005 os rios com água considerada boa representavam menos 19% do que no ano anterior, e os de água «muito má» que eram 10, 8 em 2003 passaram a ser 23, 5 em 2005.
Os rios com água julgada «excelente» eram 1% do total em 2004… e um ano depois sumiram-se nos 0% confirmados!
Isto é-- não há rios com qualidade excelente no nosso país!
A água dos rios diz respeito a muitos sectores de actividade— a energia, a agricultura, o turismo, o abastecimento domiciliário, a indústria, os desportos náuticos, a conservação da Natureza. Atender a todas as solicitações não será fácil. As cabeceiras e nascentes dos rios são zonas extremamente sensíveis. Fogos florestais ou contaminações diversas podem pôr em causa o abastecimento de áreas urbanas importantes. A engenharia pesada que constrói barragens e canais de rega, que efectua regularizações de leitos de rios, ignora muitas vezes os mais elementares princípios ecológicos e prejudica seriamente as outras valências que um rio serve.
Outro problema é o preço da água. A nova legislação impõe o princípio do utilizador/ pagador, que deve ser implementado tendo em vista a boa utilização do recurso vital. Mas é urgente rever o «preço político» que sustenta com dinheiro dos contribuintes e elevado gasto de capital natural actividades que de outra forma seriam insustentáveis e onde reina o desperdício. O turismo e a agricultura devem gradualmente conformar-se a modelos de adaptação às disponibilidades hídricas disponíveis e previsíveis para o futuro, e não «violentar» com o apoio do Estado a lógica natural, com grandes barragens e transvazes a destruir a integridade dos rios apenas para proteger actividades insustentáveis. Turismo de acordo com a paisagem e o clima, reciclagem de águas residuais, aproveitamento das águas da chuva, sistemas de rega eficientes, culturas agrícolas adequadas ao clima e recursos existentes, combate às perdas no abastecimento, são medidas que ajudarão os nossos rios a tornarem-se aquilo que nunca deveriam ter deixado de ser: rios vivos. Os efeitos previsíveis nos diversos cenários de alterações climáticas devem ser tidos em conta no planeamento da gestão dos rios portugueses.
Os acordos com Espanha garantem os caudais ecológicos em tempo de seca e de seca extrema? Este problema ainda não reuniu consenso. Mas importa garantir:
--A gestão integrada e internacional dos rios (4) internacionais que temos;
--Recusar as obras faraónicas, como o desvio das águas do Norte para Sul como pretendia (pretende?) fazer o Estado Espanhol, em favor de uma abordagem sustentável da exploração do recurso água.
--Ter em atenção os factores de ameaça à integridade dos rios e evitá-las conjuntamente;
--Garantir uma gestão adequada, racional e solidária em tempos de seca prolongada, matéria extremamente sensível para Portugal;
OS PEIXES
Como não podia deixar de ser, a biodiversidade dos rios foi profundamente afectada pelos erros e omissões que permitimos, empobrecendo os rios e pondo em causa um recurso importante.
A poluição, «regularizações» de rios— lembremos o verdadeiro crime que foram as obras ao longo do Mondego—a introdução de espécies exóticas—problema extremamente grave entre nós—a poluição, extracção de inertes, etc, além da pesca desregulada, levaram a uma situação grave em termos de biodiversidade dos rios.
O recente «Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal» dá conta da situação «muito preocupante» dos peixes dos rios portugueses.
Das 35 espécies consideradas, 63% classificam-se numa das 3 categorias de ameaça. 1 espécie foi considerada extinta. Apenas 23% ficam na categoria de «pouco preocupante».
A situação pior afecta as espécies migradoras diádromas, e por outro lado algumas espécies que são endemismos ibéricos, por vezes confinadas a uma única bacia hidrográfica.
Extinta:
Esturjão (Acipenser sturio)
Criticamente Em Perigo:
Lampreia-de-rio (Lampetra fluviatilis)
Lampreia-de-riacho ( Lampetra planeri)
Saramugo (Anaecypris hispanica)
Boga do Sudoeste (Chondrostoma almacai)
Boga-portuguesa( Chondrostoma lusitanicum)
Escalo do Arade( Squalis aradensis)
Escalo do Mira( Squalis torgalensis)
Salmão-do-Atlântico ( Salmo salar)
Truta-marisca (Salmo trutta)
EM PERIGO:
Caboz-de-água-doce ( Salaria Fluviatilis)
Esgana-gata ( Gasterosteus gymnurus)
Verdemã-do-norte ( Cobitis calderoni)
Escalo -do -sul (Squalis pyrenaicus)
Boga-de-boca-arqueada ( Chandrostoma lemmingii)
Panjorca( Chondrostoma arcasii)
Barbo-do-sul (Barbus sclateri)
Cumba (Barbus comiza)
Sável (Alosa alosa)
Enguia-europeia( Anguilla anguilla)
VULNERÁVEL:
Savelha ( Alosa fallax)
Boga-do-Guadiana( Chondrostoma willkommii)
Bordalo ( Squalis alburnoides)
Lampreia-marinha (Petromyzom marinus)
Ainda outras espécies distribuem-se pelas categorias de «quase ameaçadas» e «informação insuficiente».
Bernardino Guimarães
Excelente síntese,vou usar nas minhas aulas.
ResponderEliminarUm problema que ninguém liga e que aqui refere é o tipo de turismo em função do clima.Porquê campos de golfe onde escasseia água?