sexta-feira, julho 02, 2010

O PARQUE E O RIO


Há poucos dias, foi apresentado aquilo que pode ser considerado o início do Parque Oriental do Porto. Uns 20 hectares que aproveitam o relevo e a vegetação original, naturalmente com a directriz de melhorar e tornar acessível e confortável o local para usufruto das pessoas. Não será demais saudar o acontecimento, até porque já leva décadas a ideia de salvaguardar um vasto espaço verde na zona mais deprimida e menos favorecida do concelho portuense, entre os vales dos rios Tinto e Torto, na freguesia de Campanhã, sendo que a superfície agora aberta ao público é apenas uma parte do que poderá, e deverá ser o grande parque do lado nascente da Invicta.
Mas a tarefa de alargar e dar sentido ao Parque não será fácil.
As dificuldades são mais que muitas: os terrenos que falta integrar no Parque são privados e as finanças municipais, como as do país, não parecem estar em condições de resolver o problema. A solução, na mente dos eleitos autárquicos, passará por uma engenharia financeira que permute terrenos e abra caminho a alguma construção nas bordas do Parque, sendo certo que esses expedientes nem sempre se revelam lineares e positivos para a integridade do entorno natural.
Quem conhece a zona sabe que ali se guardam tesouros de paisagem e de biodiversidade que quase se não acredita estarmos na grande cidade…e locais de grande beleza remetem-nos para uma natureza que se salvou naquele rincão porque o atraso e o esquecimento deixaram para trás as transformações urbanas nesse Porto desconhecido, paredes meias com bairros problemáticos onde a qualidade de vida é miragem, e existem problemas sérios de isolamento das populações, carência de infra-estruturas básicas e tudo o que mais se sabe. O Parque, se acompanhado do investimento necessário na integração social e renovação urbana sustentável, ser um instrumento para a elevação das condições de vida dos que ali moram. Sabe-se como a existência de amplos espaços verdes ajuda a melhorar a saúde e a vida das populações!
Na imaginária fronteira com Gondomar, o Parque Oriental não cumprirá a sua função ecológica e social nem terá escala suficiente sem os esforços conjuntos dos dois municípios vizinhos. Em Gondomar existem terrenos que completam e fazem parte integrante do conjunto paisagístico e territorial que dá corpo e continuidade ao Parque, que-- por isso mesmo-- deveria ser intermunicipal ou de âmbito metropolitano. Reduzido à mínima expressão, o espaço verde definhará e ficará diminuído e longe do que foi o sonho de muitos durante tantos anos.
A coluna vertebral do Parque/futuro é o rio Tinto, bordejado de campos agrícolas—quase todos abandonados-- e de vegetação ripícola nos locais ainda não entubados e arrasados pela lógica da especulação e do desmazelo; mas a poluição do rio impede o Parque de ser, minimamente um local agradável.
O espantoso falhanço na despoluição do rio, a falta de esforços conjuntos dos municípios para o salvar, a incrível degradação do curso de água, com a ETAR de Rio Tinto a fingir que funciona e boa parte da bacia hidrográfica transformada em caneiro de esgoto, tudo isso entristece e inquieta. Com tal panorama, dificilmente se pode sequer falar em Parque.
Será preciso um rasgo de iniciativa, de cooperação e de mudança. Poderemos contar com isso?
Bernardino Guimarães
( Crónica para Antena 1, em 1/7/10)

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