Mostrar mensagens com a etiqueta consumo sustentável. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta consumo sustentável. Mostrar todas as mensagens

domingo, abril 26, 2009

CONSUMO

A sociedade de consumo esta aí para ficar. Todos temos, de certa maneira, consciência de que, demasiado, nos rendemos ao seu brilho – mas nem por isso fazemos grande coisa para nos livrarmos dessa volúpia, que nos impele a comprar e comprar, gesto paradoxalmente tão associado (habilmente?) à nossa liberdade individual.
Entre culpa e sensação de rondarmos o inevitável, talvez o pior seja essa impressão vaga de absurdo, tão presente e tão ignorada. Há boas razões pare que assim seja – mesmo em época de crise económica. O comércio, hoje em boa parte globalizado, dotou-se de instrumentos agressivos e eficazes, criando necessidades, ampliando desejos, iluminando apelos.
O “marketing” conhece bem os seus alvos e é suposto que os identifique, individualize e distinga, porque o tempo de mercado uniforme vai cedendo o passo a escolhas diversificadas, visando inteligentemente segmentos sociais, escalões etários, idiossincrasias regionais e as “tribos” mais diversas do universo fragmentado.
A publicidade é uma arma – e uma arte, cujo estro criativo se nos dirige todos os dias. Seria demasiado fácil culpar os publicitários e o seu trabalho. Só que esta coisa do consumo não se deslinda com “sentenças” peremptórias. E onde havemos de arrumar a nossa própria falta de discernimento? Sejamos claros: uma sociedade próspera, que permite o acesso generalizado a uma infinidade de bens de consumo e de serviços, não tem só maus aspectos.
Os que vivem na pobreza, na carência extrema do que é essencial para uma vida digna – e são no Mundo a maioria – sonham com uma sociedade assim. Em Portugal, muito do fascínio pelo consumo justifica-se pela memória dos tempos de pobreza e isolamento do país, memo que a simples consulta das frias estatísticas nos envolva numa realidade actual, de muita desigualdade e indigência.
A verdade é que, para os que têm mínimo acesso ás luzes do consumo, também a factura não se faz esperar – altos níveis de endividamento, passivo ambiental cada vez mais incontornável.
É que a tal sociedade de consumo parte do principio de que são inesgotáveis os recursos naturais – o que os factos desmentem dramaticamente. Enormes quantidades de resíduos de todo o tipo são a consequência primeira dos excessos praticados. Mesmo com o aumento da consciência ecológica, não parece que se relacionem ainda estes factos como seria lógico fazê-lo.
De qualquer modo, talvez a aposta certa deve ser na qualidade…do consumidor. A “sociedade” tem as costas largas. Mas a nossa vontade inteligente, na hora de consumir, pode fazer muito, tornando o consumidor mais cidadão.
Exemplos? Para além da melhor escolha qualidade/preço, podemos felizmente optar por produtos que garantidamente sejam menos prejudiciais ao ambiente – e á saúde. Podemos exigir do comércio que venda e exponha esses produtos. Preferir menos embalagens, não premiar o desperdício visível, são atitudes fáceis e úteis. Quem não quiser contribuir para o fim das florestas tropicais, deve preferir madeira ambientalmente certificada.
Se o consumo deve ser o mais possível sustentável, também no mundo inteiro há quem o queira mais “ético”. Em relação à natureza, mas também à justiça social. Vai sendo viável procurar o “Comércio Justo” que tenta estabelecer relações de troca mais equitativas com os produtores dos países pobres. E existe já alguma certificação que nos alerta contra importações produzidas em desrespeito pelos direitos humanos (recurso a trabalho infantil e à semi-escravatura.)
Escolhas. Muito depende de nós, afinal. Não por má consciência – mas por vontade de agir e mudar.
Bernardino Guimarães

domingo, abril 19, 2009

A CRISE DOS SACOS DE PLÁSTICO

Imaginar o mundo sem sacos de plástico a rodos, multiformes, multicores, omnipresentes— não é tarefa fácil. Essa expressão máxima de um certo consumismo, e da produção em massa, quase não se dissocia do mundo das compras, das grandes superfícies, do acto de comprar, pagar e sair. E no exterior desses super ou hiper centros de vendas, o Ambiente paga o preço. Gratuitos para o consumidor, os sacos de plástico saem caros a todos e por muito tempo. Dificilmente degradáveis, demoram inteiros enquanto poluição, décadas a fio. Atapetam campos e ruas e praias, entopem esgotos e sarjetas, «enfeitam» e enchem os aterros, dão que fazer às incineradoras, flutuam no mar e atravancam rios.
Mas afinal, os consumidores adoram assim tanto esses sacos, como os amantes de flores esperam a Primavera, como os sonhadores anseiam pela estrela da manhã, como os autarcas veneram as rotundas? Não exageremos, que o hábito de distribuir e disseminar estes objectos é recente e bem podia ser ultrapassado.
O volume de resíduos que é gerado, a dificuldade da sua reciclagem, a contaminação duradoura dos ecossistemas, sugere a necessidade de introduzir alguma racionalidade neste desperdício. Outros países o fizeram, com sucesso. Algumas superfícies comerciais iniciaram a cobrança de um preço (dois ou três cêntimos) sobre o saco de plástico, levando à imediata redução do volume consumido. Se imaginarmos o ritmo de crescimento deste problema em Portugal e se soubermos que são por cá utilizadas umas 2000 toneladas anuais de sacos de plástico (500 mil toneladas no mundo), fica claro que algo mais deve ser feito.
Esse «algo» podia ser a imposição de uma taxa uniforme para os sacos, medida que o governo ensaiou ou chegou a anunciar. Acontece que a indústria protestou…e o ministério do Ambiente meteu a viola no saco…plástico, morrendo ao nascer a tentativa. Alegou-se que as empresas pagam já uma taxa sobre todas as embalagens, para financiamento da recolha e tratamento desses resíduos.
Mas, conforme foi explicado por um responsável da Quercus, trata-se de duas coisas distintas. Pagar a taxa para a Sociedade Ponto Verde, que é uma regra comunitária e serve para reciclar, não será o mesmo que taxar um produto no sentido de evitar a sua utilização excessiva. Seja como for, este recuo governamental, demonstra a fragilidade de quem tem hoje em mãos a tarefa de defender o Ambiente…quando confrontado com interesses particulares de vistas curtas. Diz-se que outras alternativas vão ser estudadas: a distribuição de sacos reutilizáveis ou biodegradáveis, ou a adopção generalizada pela distribuição, de um preço mínimo, capaz de dissuadir o consumo exagerado de sacos de plástico. Veremos o que acontece.
Neste caso como em tantos outros, as medidas que visam proteger o Ambiente e travar ou minorar o uso desregrado dos recursos, seguramente levantam oposição. Se sempre que as indústrias reclamaram, os governos tivessem recuado, assustados, ainda hoje seguramente não haveria leis contra a poluição dos rios ou relativas à qualidade do ar.
Cabe também aos consumidores a atitude preventiva e útil: usar sempre o mesmo saco de compras, recusar a super-oferta de plástico gratuito…e inútil.
Os cidadãos podem e devem dar as suas «ordens» ao mercado— assim como a escolha do que implica menos desperdício e poluição introduz no sistema uma indicação que as empresas não deixarão de levar em conta. É um grande erro menosprezar a força que pode ter o gesto individual e quotidiano…para o bem e para o mal!
Mesmo quando os governantes hesitam, isso pode ser decisivo!
Bernardino Guimarães
(Crónica publicada em Dezembro de 2007 no Jornal da Notícias. Infelizmente, não perdeu nada da sua actualidade.)

quinta-feira, abril 02, 2009

RUÍDO VERDE

Fala-se de Ambiente, de Ecologia, de desenvolvimento sustentável, durável? Muito bem, ainda bem. Fala-se demais, a propósito e a despropósito? É um problema. O jornal «New York Times», outro dia, queixava-se (dando eco a uma preocupação que aumenta) do «ruído verde» (green noise), entendido como uma «cacofonia criada pelo excesso de informação ecológica que pode transformar uma ida ao super-mercado num exercício matemático que está muito para lá de fazer as contas ao que se compra.» Embora não pareça ser caso para drama, o circunspecto diário pode ter alguma razão: se o consumidor quer diminuir o impacte ecológico do seu consumo, como é necessário e indispensável, é preciso que esteja na posse da informação básica, sintética e clara, dispensando-se o pormenor que complica e os dilemas de resolução demasiado complexa, quando é preciso agir depressa, no afã do dia-a-dia. Escolher o que se compra é importante. Produtos menos contaminantes. Compras de preferência com origem local, evitando o transporte dispendioso em energia. Menos embalagens. Preferir materiais recicláveis e /ou reutilizáveis. Dar atenção à rotulagem.
Tudo isto é já muito. Como alguém disse sobre este assunto, o essencial é mesmo só comprarmos aquilo de que realmente precisamos.
Admite-se que, com recta intenção de esclarecer e ajudar, possa haver excesso de informação que apenas torna pouco aliciante a concretização da boa vontade inicial do consumidor que quer ser cidadão.
Mas outro problema, esse bem mais complicado, se agiganta: são hoje tantas as empresas e produtos a reclamarem a sua bondade «ecológica», o seu menor impacto na natureza, que o consumidor duvida. E duvida bem: é esse o «ruído verde» que mais nos deve preocupar. A corrida à titularidade ambiental, a profusão de mercadoria «boa para o ambiente» está a criar uma fundada dificuldade na separação (e reciclagem?) do trigo e do joio, operação que uma publicidade insidiosa e eficaz torna cada vez mais complexa. Um dado produto é «menos» poluente na sua fabricação? Outro faz corar a concorrência com a sua «performance» sustentável?
Só um eficaz e sóbrio sistema de certificação pode ajudar-nos na destrinça. Muito gato por lebre se vende por aí…e o Ambiente não ganha nada com isso.
Não se infira que tudo são ledos enganos. Há esforços assinaláveis de muitas empresas. O problema é que, para lá do «ruído verde», abunda por aí a «lavagem verde» (greenwashing), que faz de empresas predadoras, muitas delas à escala global, campeãs instantâneas do ambientalismo. Os instrumentos destas metamorfoses são geralmente os «Relatórios de Sustentabilidade» (mesmo quando, bem lidos, são mera listagem de lugares comuns) e as «campanhas ambientais» financiadas com desvelo— e que até podem ter útil efeito, mas resultam de facto no «esverdeamento» da actividade geral e primordial da empresa ou empresas. Trata-se efectivamente de uma forma de «blindagem» que procura ocultar mais do que contribuir.
Bem podíamos ainda, nesta floresta de equívocos, incluir, por exemplo, certas atitudes de responsáveis políticos e a acção da autarcas e governantes. De que vale inaugurar um jardim, se no mesmo dia se legalizam loteamentos em áreas que eram verdes ou se força a desanexação de reserva ecológica e agrícola? Cuidado, pois, com as imitações, entre ruídos e lavagens…de consciências!
Importante é a atenção que devemos dar a tudo isto. Não causa surpresa ver também o Ambiente sofrer os efeitos de alguma hipocrisia. Sobre as formas de disso nos defendermos, valerá a pena falar em outra crónica.

Bernardino Guimarães
(Crónica publicada no Jornal de Notícias em 2/9/2008)